sexta-feira, 27 de junho de 2008

Apesar do euro ter atingido o ponto mais alto de sempre face ao dólar, deixou de ser a almofada contra a alta do preço do petróleo. O custo de vida vai agravar-se.
O euro está no valor mais alto de sempre frente ao dólar, mas deixou de proteger as economias europeias do choque petrolífero. Isto é, o preço médio do barril de petróleo em euros ultrapassou esta semana a média do ano passado, apesar da moeda única valer quase 1,5 dólares. Isto acontece porque o ritmo de subida do ouro negro é superior ao da taxa de câmbio e não deverá perder músculo nos próximos meses.
O barril de Brent (oil price), negociado em dólares, estava ontem 8,5% mais caro do que a média de 2006; em euros valia mais 0,2%, quando até aqui esteve a cair. A cotação média diária do barril em 2007 (70,7 dólares) também já ultrapassa a prevista pelo Governo no Orçamento do Estado, de 69,5 dólares. Daqui em diante, dizem os especialistas, a situação tenderá a agravar-se, ou seja, empresas e consumidores vão sentir cada vez mais o impacto negativo da subida do petróleo e do euro.
“Não vai parar de subir. Continuo muito preocupado pois nada mudou nos fundamentais: a oferta de petróleo não tem capacidade para crescer mais e a procura continua em alta com o forte crescimento das economias emergentes”, lembra José Caleia Rodrigues, economista especializado no sector da energia.
Esta tese é defendida por outros observadores, como Agostinho Pereira de Miranda, advogado e consultor nesta mesma área, e Nuno Ribeiro da Silva, professor de Economia da Energia do ISEG.
Os efeitos nos combustíveis deverão ser sentidos já na próxima semana, pois os mercados liberalizados ditam que as alterações nos preços internacionais (oil price) se reflictam de forma quase instantânea nos preços aplicados aos consumidores finais, sejam particulares ou empresas.Por um lado a apreciação da moeda única dificulta seriamente os negócios dos exportadores europeus. Por outro, a subida do preço do petróleo (oil price), além de penalizar as empresas, pesará cada vez mais na carteira dos consumidores, sobretudo nos países mais afectados pelo endividamento, onde o desemprego é um problema estrutural grave e onde a produtividade tarda em descolar – é o caso da economia nacional. Em Portugal, o duplo impacto do euro/petróleo está a ser especialmente prejudicial porque a economia é totalmente dependente do petróleo que importa e porque desperdiça a maior parte dessa energia que compra. Ribeiro da Silva e Eduardo Oliveira Fernandes, professor da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, estimam que o desperdício represente 60% da energia consumida.
Para Caleia Rodrigues, “os preços do petróleo vão continuar a galopar e Portugal está numa situação particularmente frágil”. “É uma economia pequena e dependente que sentirá dificuldades acrescidas nos próximos tempos. O custos dos transportes vão continua em alta, os da alimentação também, e é de prever uma retracção no turismo por causa dos preços das passagens aéreas”.
As cotações vão permanecer acima dos 100 dólares “porque faltam inovações tecnológicas e alternativas energéticas com aplicação em larga escala”, sublinhou Pereira de Miranda.
Caleia Rodrigues observa que “os grandes produtores até podem ter muitas reservas, mas ninguém está a investir para extrair esse petróleo porque o custo é cada vez mais elevado”.
Três indústrias sob alta pressão em Portugal
Transportes
O sector dos transportes é o calcanhar de Aquiles da economia portuguesa, já que absorve cerca de metade do consumo de petróleo. Ineficientes e dependentes da energia importada, os transportes são o eixo de transmissão mais rápido do choque internacional à economia doméstica, seja via preço da gasolina e gasóleo, seja através do transporte de mercadorias.
Alimentação
O preço dos alimentos está a subir de forma imparável, contribuindo por exemplo para um aumento da inflação e para a perda de poder de compra de todos os portugueses, mesmo os de menores rendimentos. Reflecte o custo dos transportes, mas também o advento dos biocombustíveis (movidos a cereais) e a procura cada vez maior das economias emergentes.
Turismo
Em Portugal, o crescimento da economia (a construção, o imobiliário e o sector dos serviços, por exemplo) depende do fluxo de turistas.
Para Caleia Rodrigues, o choque petrolífero vem “comprometer” o negócio das companhias aéreas e por arrasto, o turismo de massas. “O jetfuel está cada vez mais caro, não creio os actuais calendários de voos sejam sustentáveis a prazo”, avisa.
Luis Reis Ribeiro