quinta-feira, 24 de abril de 2008

Em primeiro lugar devo saudar e louvar o Institute for International Reserch pela realização deste oportuno Fórum, num momento em que os responsáveis pelos mercados espanhóis e portugueses estão a envidar os maiores esforços no incremento da convergência que decidiram assumir.
O objectivo dos promotores insere-se na vontade de prosseguir numa colaboração cada vez mais estreita entre os dois países, dando continuidade às matérias acordadas nas Cimeiras bilaterais, ao proporcionar um fórum em que os key players possam manifestar as vantagens da cooperação e detectar os constrangimentos que eventualmente estejam a dificultar o seu desenvolvimento.

Quando defendemos uma maior utilização do gás natural (reconhecidamente o combustível fóssil cuja combustão tem menor impacte ambiental) parece-nos estarmos na via correcta.
Contrariamente ao petróleo bruto convencional que aparenta sinais de tendência para esgotamento a médio prazo, o gás natural apresenta-se com enormes disponibilidades.
A situação em que o sector do petróleo bruto convencional se encontra, manifesta um fim de ciclo que se caracterizou por uma suficiente capacidade extractiva e um regular abastecimento ao mercado.


Constata-se que o gás natural tem vindo a ser apresentado nas mais recentes análises, com o maior e mais rápido crescimento registado entre todas as origens de energia primária. E espera-se que venha a assumir uma ainda maior contribuição no incremento do consumo energético a ocorrer no mundo industrializado, com especial incidência nos Estados Unidos e na Europa ocidental.
A expansão apresentada por esta alternativa energética, assente em enormes reservas detectadas e comprovadas, deve-se sobremaneira à premente procura de combustíveis menos poluentes, diversificação e segurança estratégica.
Perspectiva-se que o seu consumo duplicará até ao ano 2020, nomeadamente como combustível mais limpo e eficiente a utilizar nas centrais termoeléctricas, em grande parte devido à maior eficiência conseguida nas novas turbinas, para além da rendibilidade económica, razões ambientais, diversificação de combustível, desregulamentação do mercado e estratégia de segurança energética.
Pode-se destacar que a descoberta de reservas de gás natural duplicaram durante os últimos 20 anos, ultrapassando largamente as de petróleo.
No entanto, a verdadeira dimensão das reservas mundiais não é facilmente mensurável e a sua declaração, quer provenha de países produtores quer de empresas do sector, suscitam fortes dúvidas, dado que os números oficiais das reservas estão longe de ser dados puramente científicos. Serão o reflexo de um património financeiro que pode ser valorizado ou depreciado conforme o seu interesse temporal.
Os sustos, ainda não esquecidos, provocados pelos choques petrolíferos de 1973 e de 1979 e consequentes agravamentos da factura dos hidrocarbonetos importados, obrigaram a repensar estratégias e fontes alternativas mais seguras, a par da indispensável estabilidade política e credibilidade, que garantam a salvaguarda de riscos políticos e comerciais.
As nossas economias têm recorrido ao gás natural com o objectivo de reduzir a sua dependência em relação ao petróleo, mas, tal como o petróleo, o gás natural também põe às economias ocidentais riscos de dependência geoestratégica.
Porém, vejamos:
Enquanto o consumo de energia primária total mundial aumentou 22 por cento nos últimos 5 anos, o consumo de gás natural aumentou 38 por cento.
Este desenvolvimento não apresentou a mesma evolução nos nossos mercados.
Enquanto em Portugal o início do consumo de gás natural ocorreu quando começou a receber o gás argelino, em 1997, através do gasoduto Magreb-Europa, via Marrocos e Espanha, já por essa altura se consumia em Espanha mais de 300 metros cúbicos anuais per capita.
Numa segunda fase do projecto português, foi construído um terminal de gás liquefeito em Sines, para recepção de navios metaneiros a partir do ano de 2003.
Neste particular pode-se salientar que a tecnologia da liquefação do gás natural está a criar um mercado mundial que se poderá assemelhar ao do mercado petrolífero, na medida em que permite uma oferta e um transporte à escala mundial que pode reduzir a dependência dos mercados regionais abastecidos por pipeline e contribuir, deste modo, para um processo de formação de preços autónomo do mercado petrolífero.
Nestes últimos 10 anos desenvolveram-se as infra-estruturas de transporte e de distribuição, de armazenamento subterrâneo e de recepção em terminal de gás natural liquefeito. Esta atitude de transposição dos princípios das Directivas do Parlamento Europeu e do Conselho, viabilizou a utilização do gás natural em Portugal como uma nova fonte energética e criou condições propícias à construção de um mercado livre e concorrencial de gás natural.

Contudo, a evolução dos consumos registada no último quinquénio, reforça a diferença ainda existente entre os dois mercados ibéricos:

Em Espanha manteve-se a opção gás natural, como testemunha o registado aumento de 60 por cento. Em Portugal, apesar de muito superior ao aumento médio mundial de 12 por cento, ficou-se em apenas 32 por cento.

Uma boa notícia para o sector português, foi o recente anúncio da decisão governamental em aumentar a potência eléctrica instalada, na ordem dos 50 por cento, nos próximos 10 anos, garantida pela instalação de novas unidades produtoras, de entre as quais se salienta a construção de 4 centrais termoeléctricas de ciclo combinado a gás natural.

Foram, também, dados passos muito importantes na via da liberalização da comercialização e abertura progressiva do mercado português.
Iniciada, em 1 de Janeiro de 2007, em relação aos centros electroprodutores, alargar-se-á, a partir de 1 de Janeiro de 2008, aos consumidores de um milhão ou mais de metros cúbicos de gás natural por ano, até atingir, progressivamente, todos os demais consumidores em 2010.

Espera-se que as actividades de comercialização de gás natural estejam inteiramente abertas à concorrência nesta data, ficando apenas sujeitas a um regime de licenciamento. Os comercializadores poderão comprar e vender livremente o gás natural no mercado aberto ou através de contratos bilaterais. No novo sistema, os consumidores poderão escolher o seu comercializador ou optar por outro comercializador sem quaisquer encargos adicionais.

Não me devo alongar mais, em considerações acerca destas matérias, quando estão aqui presentes os mais importantes players do mercado.
Renovando os votos da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Espanhola dos maiores sucessos para este 1º Fórum, vejamos o que tem para nos transmitir este conjunto de eminentes oradores.


MERCADO IBÉRICO DO GÁS NATURAL
1º. Fórum Ibérico
Lisboa, 06 e 07 de Novembro de 2007
Hotel Altis Park

Institute for International Research, IIR Portugal

Discurso de abertura da Conferência

Slide 1

É por demais evidente a dependência económica configurada por numerosos países, na sua incessante busca de novas e mais seguras origens de bens energéticos, indispensáveis à manutenção do seu tecido social e económico.
O que os torna estratégicos é a sua influência na soberania e na segurança nacionais.
A energia assumiu uma posição dominante na extensa agenda política económica, demasiado rapidamente para que permitissem ser encontradas vias de estabilização.
Apresenta-se, nas suas várias formas, como símbolo de desenvolvimento económico e, ainda mais, de riqueza e prosperidade.
Consequentemente, o acesso e o controlo dos recursos energéticos constituem uma preocupação central dos governantes e de todos aqueles que se encontram envolvidos em processos de produção industrial.
Contudo, a delapidação dos recursos globais tem sido excessivamente desigual e a distribuição dos recursos naturais vitais, não é equitativa nem razoável.
As disponibilidades são abundantes, mas apresentam-se desigualmente distribuídas entre países e povos, mesmo dentro das suas próprias fronteiras políticas, raramente coincidentes com fronteiras naturais.
Enquanto o aumento do conjunto populacional do mundo economicamente menos desenvolvido induz o aumento do consumo de recursos é, contudo, nos países economicamente desenvolvidos que se verifica maior delapidação. Os actuais padrões de produção e de distribuição vigentes nos países ditos industrializados, muito provavelmente não poderão continuar a ser mantidos por muito mais tempo e a tendência para a imitação por parte dos restantes irá causar irreparáveis danos ecológicos.
As actuações na incessante procura de mais recursos energéticos pelos grandes consumidores, provocaram profundas alterações, que forçaram a economia industrial mundial a depender ainda mais das limitadas fontes de energia.

Slide 2: Evolução da população mundial
Energia primária total mundial

Uma nota prévia: Os presentes estão habituados à leitura rápida de quadros estatísticos e analíticos, pelo que me permito dispensar a sua descrição e interpretação detalhada. Servirão apenas de suporte para ilustrar os dados relevantes sobre cada matéria em assunto.

Posto este reparo, retomemos as questões que nos trouxeram aqui.

Enquanto a população mundial quadruplicou desde 1900 até aos nossos dias, a energia industrial consumida per capita, apesar de desigualmente repartida, aumentou mais de sete vezes durante o mesmo período e a energia total consumida aumentou quase catorze vezes.
A explosão demográfica aliada à exigência da perpetuação dos altos níveis de vida conseguidos nos países ricos e à legitima pretensão de os atingir, reclamada pelos países pobres, introduziram inusitadas pressões no fornecimento estabilizado e continuado dos recursos naturais à escala mundial. Estas pressões provêm tanto da privação como das dimensões ecológicas do drama populacional, igualmente importantes na nossa concepção do mundo como população global.
O consumo dos recursos disponíveis e indispensáveis à manutenção do conjunto humano, continuou a aumentar, em muitas regiões, em ritmo superior ao aumento populacional.
Senão, vejamos: quando a população mundial atingiu os 4 mil milhões de habitantes no início da década de 1970, o consumo mundial de energia era de 5.500 milhões de toneladas equivalentes de petróleo.

A população aumentou 50 por cento até ao final do século, mas o consumo da energia quase duplicou.
Mesmo assim, a resposta energética ainda não satisfez as expectativas de melhoria das condições de vida e do esperado desenvolvimento económico à escala global.
Porém, as previsões para o período 2005-2025 também não são mais animadoras.
De acordo com os dados estatísticos do U.S. Census Bureau, a população mundial atingiu os 6 mil milhões de habitantes no início do ano 2000. Esta mesma entidade publicou que tinha ultrapassado os 6.500 milhões em Agosto de 2006.
Em termos de energia primária total, para um aumento de 33 por cento da população mundial, prevista para os próximos 20 anos, exige-se um aumento de 55 por cento no abastecimento.

O rápido aumento de população, não propriamente explosão demográfica, mas caminhando nesse sentido, exigiu que o petróleo respondesse à pressão e se tornasse na principal fonte mundial de energia comercializável.

Slide 3: Petróleo bruto convencional
Evolução do consumo mundial (anos 1969-2004)
Evolução das reservas comprovadas (anos 1969-2004)

O impacto na procura mundial de petróleo pode ainda ser maior se se mantiverem as expectativas do forte aumento do consumo esperado para a China e para a Índia a curto e médio prazo. Note-se que a importação chinesa de petróleo bruto convencional aumentou quase 18 por cento nos primeiros 6 meses deste ano (2006), relativamente ao período homólogo do ano passado (2005).
O petróleo tornou-se mercadoria-chave do comércio internacional e quando os consumidores pretenderam voltar a dispor de abastecimento seguro, não tiveram outra saída que não fosse a de criar condições sob as quais a “política petroleira” se pudesse desenvolver.
Na realidade, foi devido a esse processo que as políticas petroleiras foram colocadas no topo da agenda política mundial durante os anos 70 e 80. O que fizeram, reflecte a complexa interligação de tendências e acontecimentos em diferentes centros, envolvendo uma diversidade de agentes, tanto estatais, como não-estatais.

Ao mesmo tempo, o crescendo de nacionalismos no antigamente chamado Terceiro Mundo influenciou a atitude dos Estados produtores de petróleo que começaram a exigir maiores receitas e mais eficaz controlo dos seus recursos petrolíferos próprios.
Tendo em conta o aumento populacional e o desenvolvimento económico previstos, exige-se um aumento da entrega de petróleo bruto ao mercado, na ordem dos 30 milhões de barris diários ao atingir o limiar do ano 2025.

Deduzimos quem o irá consumir!
Mas donde irá ser extraído? Quem o irá extrair?

O substancial aumento da entrega do produto ao mercado envolve prospecção, extracção, transporte e distribuição, a exigir os correspondentes colossais investimentos indispensáveis à sua realização.
As reservas comprovadas têm vindo a aumentar, graças às novas descobertas realizadas ao longo do tempo e que têm sido sucessivamente declaradas, a uma taxa próxima da do aumento dos consumos.

Slide 4: Evolução do consumo mundial de petróleo
Quota por sector de utilização (Realizado e previsto)

Note-se que o sector dos transportes (rodoviários, aéreos e marítimos) consome, actualmente, cerca de 60 por cento da produção mundial, quando, 30 anos antes, só consumia 42 por cento.
Tem sido exercido um grande esforço para conseguir meios de transporte menos “glutões”, ao mesmo tempo que se têm desenvolvido as origens alternativas para geração de energia eléctrica, responsável por uma boa parte dos restantes 40 por cento.

No entanto, é importante sublinhar que o aumento da produção foi conseguido à custa do aumento da taxa de extracção em poços de alta rentabilização comercial, dado que a quantidade de poços em actividade tem vindo a ser drasticamente reduzida.
De realçar que, enquanto os Estados Unidos operavam em quase 1.500 existentes no ano 1980, passaram para apenas 560 em 2000. A partir desta data retomaram a actividade em mais alguns deles que tinham sido desactivados e iniciaram-se algumas novas explorações.
Surgiram, porém, novos actores na cena internacional: a China e a Índia, que comportam um terço da população mundial e estão dependentes do petróleo para dar continuidade aos seus programas de desenvolvimento.
Estes novos consumidores gigantes sobrepuseram-se às economias industrializadas que foram relegadas para lugar secundário na ordem das prioridades a satisfazer.

Slide 5: Petróleo bruto convencional - Maiores exportadores (2004)

Se surgiram novos grandes mercados consumidores dependentes, também surgiu a Rússia a disputar a liderança do mercado à Arábia Saudita, baseada nas suas imensas reservas recentemente activadas, localizadas no Árctico, na margem ocidental dos Urais, na Sibéria Oriental e na Ilha Sakhalin.
No entanto, os indicadores Risco País elaborados pela COFACE, colocam os dois países em situação muito diferente.
Enquanto a Arábia Saudita é classificada como país de “quite low risk”, a Federação Russa é classificada como país de “moderately high risk”.
Esta classificação não tem causado grandes dificuldades na captação de investimentos para o programa de desenvolvimento do sector petrolífero russo, tendo em consideração os recentes enormes investimentos realizados neste sector, pelos Estados Unidos, pelo Japão, pela China e até pela própria Arábia Saudita.
Admite-se, como dado adquirido, que ambos os governos são fortemente dependentes dos recursos gerados pelas suas exportações de hidrocarbonetos. De acordo com as publicações do Fundo Monetário Internacional, enquanto para a Arábia Saudita contribuem com 38 por cento para a formação do seu Produto Interno Bruto, valem apenas 17 por cento para Federação Russa.

Slide 6: Evolução das produções sauditas e russas

A Rússia que já detém a liderança incontestada do mercado mundial do gás natural com uma quota de 22 por cento, está em vias de conseguir idêntica posição no mercado do petróleo bruto, dado que pode vir a manter, a muito curto prazo, valores de produção próximas dos 10 milhões de barris diários, o que, na actualidade, corresponde a 12,5 por cento do total mundial produzido.
A produção petrolífera da Rússia tem superado ocasionalmente a da Arábia Saudita, nos últimos 25 anos. De acordo com os números divulgados pela OPEP e citados pela imprensa britânica, a Rússia produziu uma média de 9,2 milhões de barris por dia, durante o passado mês de Junho. Mais 46 mil do que a Arábia Saudita.
Apesar das reservas comprovadas do petróleo russo não serem tão abundantes como as sauditas e da sua extracção ser mais cara, são, porém, mais vastas do que geralmente se considera.

A Rússia, na sua nova qualidade de superpotência energética, admitiu resolver o deficit chinês, indispensável à sustentabilidade da sua actual taxa de desenvolvimento económico, com a construção do oleoduto que liga os campos petrolíferos da Sibéria Oriental aos chineses de Daking, numa extensão de 2.400 quilómetros, para o fornecimento médio diário de 1,6 milhões de barris.
Por outro lado, para satisfazer igualmente a pretensão japonesa, o presidente Russo Vladimir Putin anunciou, no início deste ano, que a construção da primeira fase do oleoduto Tayshet-Nakhodka seria iniciada no Verão deste mesmo ano.
A culminar os doze anos de maratona negocial do percurso dos oleodutos, todos os três países intervenientes saíram satisfeitos.
Desta forma, quer a China, quer o Japão, vêem os seus interesses assegurados pela Rússia e obtêm a garantia de receber os pretendidos e desejados abastecimentos a partir do petróleo siberiano.
A estratégia russa não esqueceu os interessas ocidentais, se bem que em menor escala com a instalação do citado oleoduto, que também permitirá exportar petróleo siberiano para a costa ocidental dos Estados Unidos.
Mas não se ficou por aqui, a capacidade de crescimento decidida pelo Governo russo.
O Presidente Vladimir Putin, reafirmou a sua decisão, no encontro realizado no Valdai Discussion Club, no início do passado mês de Setembro, de prosseguir com o programa de expansão do seu sector energético.

A continuação do aproveitamento dos recursos existentes na Ilha de Sakhalin (situada a paredes-meias com a fronteira norte do Japão), correspondente à declaração de reservas avaliadas em 45 mil milhões de barris de petróleo bruto convencional, irá por diante, reforçando o abastecimento dos mercados asiáticos em plena expansão económica.

Também é de relevante importância, o facto de se ter iniciado, em Agosto de 2003, a construção daquela que vai ser a maior petroquímica mundial de liquefacção de gás natural, localizada nessa mesma Ilha Sakhalin para processamento de parte dos 85 triliões de m³ de gás natural existentes na plataforma continental russa, para fornecimento de gás natural liquefeito ao Japão.
Para se avaliar a dimensão de tal projecto, basta atentar que o custo total da instalação da petroquímica e dos respectivos oleoduto e gasoduto que irão constituir a segunda fase do projecto Sakhalin, atingirá um valor próximo dos 10 mil milhões de dólares.
A actuação das forças do mercado dinamizaram uma transição operada no sector petrolífero russo que lhe permitiu não só desafiar a OPEP e a Arábia Saudita, como também captar a parte de leão da quota de crescimento da procura chinesa, indiana, japonesa e, eventualmente, até dos Estados Unidos, neste caso através de joint ventures.
Slide 7: Petróleo bruto convencional
Maiores consumidores (ano 2005)

Sublinhe-se que a situação actual do sector petrolífero dos Estados Unidos não é brilhante, dado que passou de leader do mercado, nos bons velhos tempos, a rapidamente dependente da importação de nada menos do que dois terços das suas necessidades actuais.
O último estudo publicado pela Energy Information Administration revela a existência de petróleo bruto convencional no Arctic National Wildlife Refuge, actualmente fora dos limites de exploração de petróleo, em quantidades entre os 5,7 e os 16 mil milhões de barris em reservas jazentes naquela zona.
Contudo, a alternativa constituída pela exploração do Árctico choca frontalmente com os interesses ambientais da região, ainda não resolvidos.

Slide 8: Quantidade de poços em actividade e produção diária

Os Estados Unidos apesar de terem vindo a reduzir drasticamente a quantidade de poços em actividade, extraem uma média de 6,8 milhões de barris diários dos cerca de 560 poços activos, enquanto a Arábia Saudita extrai 11 milhões de apenas 53 poços e a Noruega quase 3 milhões de 19 poços. É por demais evidente que os custos de extracção por barril terão que atingir valores muito diferentes.

Slide 9: Petróleo bruto e gás natural
Estados Unidos e Federação Russa

Por outro lado, enquanto os Estados Unidos suportaram, em 2005, um custo diário médio de cerca de 759 milhões de dólares de importações de petróleo e de gás natural, a Federação Russa encaixou um valor diário médio de mais de 400 milhões de dólares em resultado das suas exportações.
Em balanço anual, os Estados Unidos pagaram mais de 300 mil milhões de dólares pelas suas importações e a Federação Russa recebeu quase 150 mil milhões de dólares das suas exportações. Esta situação tenderá a tornar-se crítica a médio e longo prazo.

Estes desenvolvimentos conduzem a novos debates acerca do verdadeiro significado da segurança e que tipo de relações duráveis será agora possível entre consumidores e produtores, de modo a que possam, a longo prazo, vir a satisfazer os interesses de ambos. A Guerra do Golfo ilustra, igualmente, tanto o crítico posicionamento do petróleo no equilíbrio de poder global, como a importância da interdependência entre produtores e consumidores industrializados.

No que se refere à União Europeia sublinhe-se que, dispondo apenas de 6,5 por cento da população mundial, contribui com mais de 25 por cento para o PIB total mundial e assegura 35,5 por cento das exportações e 34 por cento das importações registadas à escala mundial.

Slide 10: União Europeia, Balanço Produção/Consumo
Contudo, é por demais conhecida a sua dependência no que se refere a combustíveis.
O consumo do conjunto dos países-membros da União Europeia ultrapassa largamente a produção, dado que consomem 6 vezes mais petróleo do que produzem, o dobro do gás natural e 1,8 vezes mais carvão.
Podem considerar-se excepções, a confortável situação da Dinamarca, excedentária tanto em petróleo bruto como em gás natural, suportada pelas reservas disponíveis no Árctico (via Gronelândia), o equilíbrio mantido pelo Reino Unido e a recém entrada Polónia com o seu carvão.
Tendo em consideração o continuado aumento do preço do petróleo e dos seus efeitos na economia e no público, os Parlamentares europeus voltaram a chamar a atenção, em Outubro de 2005, para a necessidade de diversificar as origens energéticas, promover a conservação da energia e as energias renováveis.
É pretensão da União Europeia uma menor dependência dos combustíveis fósseis e uma maior eficiência energética. Segundo recentes declarações dos parlamentares, é preciso estimular e dinamizar o diálogo entre todos os parceiros energéticos europeus numa perspectiva de promoção da segurança do abastecimento, transparência do mercado e futuro investimento.
É de considerar que a União Europeia também já viu melhorada a sua dependência do petróleo do Médio Oriente com a entrada em serviço da chamada “Ponte energética Este-Oeste” em Julho deste ano, constituída pelo oleoduto Baku-Tbilisi-Ceyhan, que transporta petróleo bruto desde o Mar Cáspio até ao Porto turco mediterrânico de Ceyhan, com capacidade de transporte de 1 milhão de barris/dia,
Este oleoduto constitui uma importante alternativa de suplemento de petróleo à Europa Ocidental, com uma mais elevada garantia de segurança.



Slide 11: Petróleo bruto convencional
Evolução da importação portuguesa (1996 - 2005)

Podemos ver, então, de forma não exaustiva, o que se passa em Portugal, se bem que seja sobejamente conhecido de todos.
Não sendo auto-suficiente nesta matéria, encontra-se no conjunto de países que depende da importação de matérias energéticas para satisfazer o mercado da procura.
Nesta fase, as importações portuguesas de produtos energéticos são maioritariamente constituídas pelo petróleo que atinge os 71 por cento do total.
As quantidades de petróleo bruto convencional importadas por Portugal têm-se mantido relativamente estáveis, apresentando ligeiras quebras registadas nos anos 1996, 2000 e 2002.
Porém, é de salientar que a estabilidade das quantidades de produto importado não corresponde aos custos dispendidos.
Muito longe disso.
O valor pago no ano passado (2005), a preços correntes, quase quadruplicou em relação ao de 1998, ao passar de pouco mais de mil milhões de euros, para quase 4 mil milhões. Quadruplicou, em apenas 7 anos, para idêntica quantidade de produto importado.
Já no decurso do corrente ano, os valores pagos no 1º semestre em relação ao período homólogo do ano passado, registaram um aumento de cerca de 50 por cento, para apenas um aumento de 10 por cento de produto importado. Sublinhe-se, no entanto que, apesar do forte aumento dos preços, mesmo assim, registou-se um aumento da importação.

Slide 12: Portugal: Principais fornecedores (ano 2005)

No referente às importações petrolíferas portuguesas, constata-se que são largamente originárias de 2 principais mercados que assumem cerca de 50 por cento do total: a Argélia e a Nigéria.
Os indicadores Risco País elaborados pela COFACE, colocam os dois países em situação muito diferente. Enquanto a Argélia é classificada como país de “quite low risk”, a Nigéria é classificada como país de “very high risk”.
Sublinhe-se que estas duas origens correspondem a fornecimentos de petróleo bruto da mais alta qualidade, equivalente ao Bonny Light oil, cujo baixo teor de enxofre o torna altamente desejado pelo baixo nível de corrosão provocado às infraestruturas das refinarias e pelo baixo impacto ambiental efluente da refinação dos seus produtos derivados.
Após estes dois grandes fornecedores seguem-se a Arábia Saudita e o Brasil, este último a atingir posição já muito significativa no ranking de fornecedores qualificados, apesar de classificado pela COFACE como país de “moderately high risk”.

Slide 13: Portugal
Quantidade de sondagens de pesquisa de hidrocarbonetos
(1900 a 2004)

Não tem sido descurada a procura de bolsas petrolíferas na plataforma continental portuguesa.

Verificou-se uma intensa busca logo após o fim da II Guerra Mundial, com acentuada queda quando surgiram origens a preços comerciais desincentivadores do investimento.

A retoma de sondagens coincide com os períodos correspondentes aos dois grandes choques petrolíferos ocorridos na década de 1970.


É evidente que os resultados da inventariação das sondagens realizadas possa vir a constituir extracções de petróleo bruto na plataforma portuguesa, quer em offshore quer em onshore, quando os valores comerciais do barril de petróleo atinjam valores compensadores dos investimentos a realizar.
A mais recente tentativa, que representa um investimento de 5 milhões de euros, foi iniciada na bacia de Peniche por consórcio que integra a Galp, a Partex e a Petrobrás.

Slide 14: Portugal
Consumo de electricidade, por origens
(ano 2005)

É, porém, para a diversificação das origens na geração de energia eléctrica que tem sido dirigida maior atenção, num esforço de redução do consumo de petróleo.
De acordo com os dados publicados pela Rede Eléctrica Nacional, a energia eléctrica de origem em combustíveis fósseis ainda é responsável por 63 por cento do total gerado, com a energia de origem hidráulica a manter-se nos 9 por cento do total.
Têm sido desenvolvidos consideráveis esforços na produção de energia eléctrica de origem eólica. Esta, ainda só contribuiu com 5 por cento dos cerca de 35.000 GWh produzidos em 2005. Mesmo assim, foi suficiente para colocar Portugal em 11º no ranking mundial.
A recente adjudicação da instalação de mais 1.200 MW de origem eólica, a instalar em 48 parques produtores, irá duplicar o seu contributo, colocar Portugal nos top five à escala mundial e ultrapassar a produção de energia eléctrica de origem hidráulica.
De realçar, igualmente, a construção da Central fotovoltaica de Moura, a maior à escala mundial, onde serão instalados 350.000 painéis solares, correspondentes a uma capacidade instalada de 62 MW.

Porém, no conjunto de constrangimentos a ultrapassar à escala mundial, procede a considerável questão de como conciliar o inevitável e continuado aumento da utilização dos hidrocarbonetos, com os imperativos ecológicos e ambientais. Caso paradigmático é o conflito de interessas inerentes à manifesta vontade de extracção dos imensos recursos disponíveis no Árctico ou a construção premente e urgente de novas e mais adequadas refinarias.

Slide 15: Petróleo bruto convencional
Evolução das reservas, produção, refinação e consumo (1970-2003)

Como podemos constatar, a refinação foi o único componente que não acompanhou o desenvolvimento do sector.
O período em que decorreram os dois grandes choques petrolíferos (1973 e 1979/80) corresponde, naturalmente, ao período em que decresceu a declaração de novas reservas exploráveis. Retomadas em ritmo acelerado até 1988, ano em que passaram a estar novamente estabilizadas em relação à produção e correspondente consumo.
Os aumentos de produção registados durante o período dos dois choques petrolíferos destinaram-se à captação de petróleo para reforço das reservas estratégicas dos países dependentes, cientes da imprevisibilidade da duração dos boicotes.
Também continuamos à espera da resolução das críticas situações decorrentes da partilha do Mar Cáspio e da encruzilhada vivida no Afeganistão, apenas possíveis de tratar na arena política internacional.
A questão dos oleodutos também é fundamental.
Numerosos países que dispõem de vastas reservas comprovadas estão impedidos de exportar as suas potenciais produções por não disporem das indispensáveis vias de escoamento, resolúvel pela simples construção de oleodutos, a que se agrega, nalguns casos, instalações portuárias adequadas.
Slide 16: Reservas mundiais de petróleo

Temos vindo a tratar do petróleo bruto leve, dito convencional, que, de acordo com os dados publicados pelo Departamento de Energia dos Estados Unidos, corresponde, apenas, a 30 por cento do petróleo total disponível no mundo.
Destacam-se os petróleos pesados e extra-pesados, ditos não convencionais, que correspondem aos restantes 70 por cento, ainda muito modestamente aproveitados, e os combustíveis líquidos obtidos a partir da sintetização do carvão natural.
Uns e outros muito abundantes em reservas já comprovadas.

Slide 17: Reservas mundiais de petróleo bruto não-convencional

O grande óbice à utilização maciça dos petróleos não-convencionais reside nos custos de extracção e de processamento. No que se refere à sintetização do carvão os custos de processamento são elevadíssimos.

Ambos exigem um grande esforço financeiro de retorno a longo prazo.
Recorde-se que o petróleo convencional (leve) a caminho de um rápido esgotamento dispõe de uma característica fundamental inultrapassável: existente num jazigo petrolífero sob pressão, jorra de um furo que atinge a bolsa que o contém, sem necessidade de grandes operações complementares para extracção e processamento ou de tecnologia específica.
Além de que a indústria petrolífera requererá níveis de investimento muito mais elevados do que durante o passado recente, para compatibilizar a satisfação da procura com as exigências ambientais e o acréscimo dos custos resultantes da implementação dos reforçados sistemas de segurança.
Seremos obrigados a conjugar as várias fontes energéticas alternativas disponíveis, utilizá-las racionalmente e optar entre ambiente mais limpo ou manutenção do desenvolvimento económico. No equilíbrio das várias opções a tomar, residirá o bem-estar da civilização, tal como a conhecemos.

Aos países extremamente dependentes que não possam suportar tão grandes encargos, não restará outra saída que não seja a de investir fortemente nas energias alternativas: hidráulica (se tiverem água), eólica (se tiverem vento), fotovoltaica (se tiverem sol) ou biomassa (se tiverem solo arável e água).
E fazer um esforço titânico para conseguir manter operacional o seu parque de transportes.
Para terminar, façamos uma rápida análise à evolução dos preços do petróleo bruto leve, dito convencional, ao longo dos últimos 35 anos.

Slide 18: Petróleo bruto convencional
Evolução dos preços constantes referidos ao ano 2005 (1970-2005)

Constatamos, imediatamente, que os preços do barril dispararam em quatro ocasiões, devido não a causas imputáveis ao sector produtivo ou ao mercado, mas sim à ocorrência de factos políticos ou, até mesmo ao temor da sua ocorrência a curto prazo.
A primeira aconteceu com o embargo de fornecimentos da OPEP, imposta aos países que apoiaram a política dos Estados Unidos para o Médio Oriente, em 1973, o chamado 1º choque petrolífero.
A segunda deveu-se à ocorrência da revolução iraniana de 1979, que culminou com a deposição do Shah Reza Pahlavi e consequente bloqueio à extracção de petróleo dos seus poços em actividade normal. De seguida deflagrou a Guerra entre o Irão e o Iraque.
Foi o 2º choque petrolífero de consequências muito mais gravosas do que o primeiro.
Contou-se, porém, nessa conjuntura, com a preciosa ajuda da Noruega que passou de uma produção diária de cerca de 500.000 barris para os 3,5 milhões, o que a passou a colocar no importante lugar de terceiro maior exportador mundial de petróleo bruto convencional, posição que ainda ocupa, logo a seguir à Arábia Saudita e à Rússia.
A partir destes factos fortemente influenciadores dos preços, entrou-se num período de relativa estabilização, até que se atingiu um novo mínimo em 1986.
A terceira ocasião chegou com a invasão do Kuwait pelas tropas iraquianas, em 1990, para voltar a estabilizar pouco depois.
Por último, a grande convulsão provocada pelo abrandamento económico mundial, consequente do ataque terrorista do 11 de Setembro nos Estados Unidos.
A partir desta última ocorrência de cariz político, exógena ao sector produtivo petrolífero, os preços retomaram a sua tendência altista, a que não são alheios os baixos investimentos realizados durante as décadas de 1980 e 1990, nomeadamente à escala da prospecção e da abertura de novas extracções em bolsas petrolíferas comprovadas.
O investimento só foi fortemente relançado a partir do início da década de 2000, um pouco por toda a parte, salientando-se o de orientação do sector petrolífero russo, como já tivemos oportunidade de enunciar.
A Arábia Saudita também acaba de anunciar a decisão da Saudi Aramco em avançar com o megaprojecto destinado ao aumento da sua capacidade produtiva, através do desenvolvimento do campo petrolífero dos Khurais, que inclui a abertura de 300 poços em 23 novas localizações já identificadas. O valor a investir atinge os 3 mil milhões de dólares, para obtenção de mais 1,2 milhões de barris diários de petróleo bruto leve de alta qualidade, a partir do ano 2009.
As empresas portuguesas acompanharam o relançamento mundial de investimento no sector petrolífero, nomeadamente com a obtenção de um conjunto de concessões para exploração no Brasil, tanto em onshore, onde já garantem a sua participação em 33 blocos petrolíferos, como em offshore em águas profundas, onde estarão presentes em 5 blocos.

Slide 19: Petróleo bruto convencional
Evolução da produção mundial e preços correntes (1960-2005)

A análise da evolução da produção e abastecimento do petróleo bruto convencional ao mercado, pouco reflecte a variação dos preços.
Exceptuando os períodos em que ocorreram os dois choques petrolíferos, o consumo aumentou a taxas relativamente constantes, independentemente da variação dos preços correntes.

A nova dimensão de segurança entre nações exportadoras e nações importadoras dependentes desta matéria-prima estratégica, resultará da interligação entre o investimento, a finança e o comércio. Os produtores procurarão obter dos países consumidores: o capital, a tecnologia e a competência técnica, ao mesmo tempo que abastecerão os seus mercados.
Esta reorientação incitará a um redobrado esforço dirigido à investigação e à detecção de oportunidades, quer de investimento quer em participação no desenvolvimento das estruturas do sector.

Deixo-vos com uma questão para a qual ainda não encontrei resposta: “Que valor de mercado deverá atingir o barril de petróleo para que mobilize a captação dos desejados e indispensáveis megainvestimentos requeridos pelo sector petrolífero?”.



II Conferência Risco País
Desafios para a Europa e Portugal

“Energia, Petróleo: Oportunidades de investimento”
Porto, Hotel Sheraton, 9.Nov.2006

Comecemos por evidenciar a dependência económica configurada por numerosos países, na sua incessante busca de novas e mais seguras origens de bens energéticos, indispensáveis à manutenção do seu tecido socio-económico.

As populações reclamam o direito à energia!

De forma mais equitativa e mais razoável.

Porém, quer a Carta da Organização das Nações Unidas (1945) quer a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) são omissas quanto a esse direito.
Para culminar a questão, a Resolução 1803 (1962), da Assembleia Geral das Nações Unidas, atribuiu a soberania permanente sobre os recursos naturais aos povos das nações em cujo território se encontrem. Quer em terra firme, quer em águas territoriais atribuídas.

O princípio de soberania permanente sobre recursos naturais, garante primário do poder económico, começou a ser reclamado no início dos anos cinquenta, com o objectivo de justificar a revogação ou a alteração dos termos das concessões detidas por empresas estrangeiras, às quais tinham sido assegurados os mais amplos direitos de extracção de petróleo ou de minerais, em territórios dos Estados adjudicantes.
Estas concessões foram consideradas “não equitativas”, por serem marcadamente mais vantajosas para o concessionário estrangeiro do que para o Estado adjudicante, ou terem sido concedidas em resultado de coação ou abuso de influência.
A Declaração do Princípio da Soberania Permanente, como passou a ser conhecida, despontou no decurso do processo de descolonização e os novos Estados independentes sentiram-se no direito de reavaliar e alterar os acordos legais “não equitativos” sob forma de concessões, herdados do período colonial durante o qual os investidores estrangeiros (maioritariamente empresas multinacionais com as suas sedes no país metropolitano) tinham podido dispor de direitos de exploração dos recursos naturais encontrados dentro dos seus territórios.

A alteração, passou a poder ser efectuada, pelo exercício de:

· o direito de nacionalizar, isto é, de tomar os direitos detidos pelo investidor estrangeiro;
· o direito de alterar certos termos dos acordos
ou
· denunciar um acordo estabelecido com o investidor estrangeiro.

As novas estruturas, não só proporcionaram maiores receitas, como também possibilitaram aos Estados assumir a propriedade dos seus próprios recursos e mecanismos associados, há tanto tempo ambicionados, tanto para o desenvolvimento das capacidades nacionais, como para lhes permitir assegurar um efectivo controlo das operações.

Esta nova Ordem suscitou o aparecimento e o desenvolvimento de colossais empresas nacionais que actualmente dispõem de enormes recursos, quer financeiros quer em capacidade produtiva, de tal monto que podem mesmo vir a ameaçar a já fragilizada posição detida pelas majors, a curto ou a médio prazo.
Numa curta análise, podemos constatar, baseados nos elementos disponíveis caracterizadores das maiores empresas petrolíferas mundiais, como as nacionais dominam hoje a produção, continuando a ficar nas mãos das majors a liderança da refinação e da comercialização.

Se bem que a soberania permanente sobre recursos naturais, seja actualmente reconhecida como princípio fundamental do direito internacional, a precisa definição do seu alcance e implicações permanece uma tarefa jurídica de grande importância, não só porque se trata de um princípio que está passando por sucessivas adaptações, mas também porque continua a ser uma fonte embrionária donde emanam regras para salvaguarda dos interesses dos países em desenvolvimento, sobretudo no que se refere à utilização dos seus recursos naturais.
Ao abrigo deste princípio, uma Nação, mesmo de reduzida dimensão económica e territorial, mas que disponha de invulgar abundância de recursos naturais, pode vir a desfrutar de alto rendimento nacional, independentemente do seu estádio de desenvolvimento.
Bons exemplos a referir, podem ser os do Kuwait ou da Arábia Saudita, que têm conseguido atingir altos rendimentos per capita há décadas, graças à abundância do petróleo existente nos seus territórios.
Repare-se, igualmente, que o valor das exportações do petróleo angolano já vale 65 por cento do seu PIB nacional.
Porém, a exagerada dependência dos recursos naturais pode conduzir a situações de muito difícil solução, como são as relacionadas com o seu esgotamento, encaminhamento dos mercados clientes para outras origens ou, até mesmo, ao aparecimento de tecnologias que possam reduzir ou eliminar a necessidade desses recursos.
Em face deste panorama e do Direito Internacional Público, seremos obrigados a conjugar as várias fontes energéticas alternativas disponíveis, utilizá-las racionalmente e compaginar ambiente mais limpo com desenvolvimento económico.
No equilíbrio das várias opções a tomar, residirá o bem-estar da civilização, tal como a conhecemos.
A futura geração de energia requererá níveis de investimento muito mais elevados do que durante o passado recente, para compatibilização da satisfação da procura com as exigências ambientais, a descarbonização dos produtos energéticos e o acréscimo dos custos resultantes da implementação de reforçados sistemas da segurança das unidades de produção e de transporte.
Em termos de energia primária total consumida à escala mundial, o sector ainda se encontra dependente do recurso aos combustíveis fósseis, na ordem dos 88 por cento.

Acresce a insegurança da continuidade do regular abastecimento, não só por causas exógenas e endógenas ao sector dos combustíveis fósseis, sobretudo no que se refere ao petróleo bruto convencional, mas também pelos elevados riscos país, analisados e divulgados pelas entidades seguradoras.

Encontrámo-nos hoje, aqui, para analisar a envolvente deste produto comercializável que cairia na esfera do marketing internacional, logo sujeito às leis do mercado da oferta e da procura, se não se tivesse tornado preponderante produto estratégico.
O que o torna estratégico é a sua influência na soberania e na segurança nacionais.
Contrariamente aos mais tradicionais aspectos de segurança dirigidos às ameaças que vêm do exterior, muitos dos correntes acontecimentos que tocam na segurança nacional, enfatizam o aumento das ligações entre o domínio doméstico e o internacional.

Para tanto, basta ver como as expectativas económicas são cada vez mais realçadas pelas populações e como, frequentemente, não podendo ser encontradas nos próprios recursos do Estado, ao ser exigidas aos Governos e não encontrando suficiente satisfação, podem criar instabilidade interna e consequente aumento da insegurança.

Não posso deixar de sublinhar que quando ouvimos falar em crise de petróleo deparamo-nos com um perigoso equívoco.
Nem parece que esta escassa e finita matéria-prima, ou mesmo o sector petrolífero, estejam a atravessar uma crise que, por definição, é transitória. Nada que se possa comparar com boicotes, choques petrolíferos ou consequências de situações políticas pontuais, como algumas vividas no passado.
A situação aparenta um fim de ciclo que se caracterizou por uma suficiente capacidade extractiva disponível no sector e um continuado e regular abastecimento ao mercado.
Podemos enumerar a acumulação de constrangimentos exógenos a que o sector foi sujeito, de entre os quais se podem salientar:

· a duplicação da população mundial tendente para explosão demográfica, dado que passou dos 3 para os mais de 6 mil milhões de habitantes em apenas 40 anos,
· o aumento desmesurado do consumo de combustíveis fósseis
e
· as constantes e sucessivas pressões geopolíticas que têm colocado o sector petrolífero em permanente instabilidade.

Mas também encontramos muitos factores dentro do próprio sector, que lhe provocaram grandes constrangimentos, como seja:

· a escassez da oferta,
· o encerramento de inúmeros poços de extracção, não totalmente substituídos por outras novas explorações,
· o sector da refinação ter sido submetido a idêntico processo, nalguns casos devido à exigência de adaptação ás novas regras ambientais. Enquanto, no início da década de 1980 se dispunha de uma capacidade de refinação superior ao consumo em cerca de 25 por cento, situa-se, actualmente, em valores muito próximos dos do consumo.
Ou seja, o sector da refinação dispõe apenas, actualmente, de uma margem mínima de capacidade para acomodar mais aumentos de produto a entregar ao mercado.
e
· o arrefecimento do investimento durante as décadas de 1980 e 1990, em toda a cadeia petrolífera, desde a sondagem e detecção de novas bolsas, abertura de novas extracções até à construção de novas e mais adequadas refinarias.

A energia assumiu uma posição dominante na extensa agenda política económica, demasiado rapidamente para que permitissem ser encontradas vias de estabilização.
Apresenta-se, nas suas várias formas, como símbolo de desenvolvimento económico e, ainda mais, de riqueza e prosperidade.
Consequentemente, o acesso e o controlo dos recursos energéticos constituem uma preocupação central dos governantes e de todos aqueles que se encontram envolvidos em processos de produção industrial.
Contudo, a delapidação dos recursos globais tem sido excessivamente desigual e a distribuição dos recursos naturais vitais, não é equitativa nem razoável.
As disponibilidades são abundantes, mas apresentam-se desigualmente distribuídas entre países e povos, mesmo dentro das suas próprias fronteiras políticas, raramente coincidentes com fronteiras naturais.

Enquanto o aumento do conjunto populacional do mundo economicamente menos desenvolvido induz o aumento do consumo de recursos, é nos países economicamente desenvolvidos que se verifica maior delapidação.

Os actuais padrões de produção e de distribuição vigentes nos países ditos industrializados, muito provavelmente não poderão continuar a ser mantidos por muito mais tempo e a tendência para a imitação por parte dos outros irá causar irreparáveis danos ecológicos.
As actuações na incessante procura de mais recursos energéticos pelos grandes consumidores, provocaram profundas alterações, que forçaram a economia industrial mundial a depender ainda mais das limitadas fontes de energia.
Se não, vejamos: quando a população mundial atingiu os 4 mil milhões de habitantes no início da década de 1970, o consumo mundial de energia era de 5.500 milhões de toneladas equivalentes de petróleo.
A população aumentou 50 por cento até ao final do século, mas o consumo da energia quase duplicou.
Mesmo assim, a resposta energética ainda não satisfez as expectativas de melhoria das condições de vida e do esperado desenvolvimento económico à escala global.
Não é demais repetir que o consumo de energia não é equitativo nem razoável.
À guisa de exemplo, note-se que os noruegueses consumiram 424 milhões de Btu per capita em 2004, enquanto os angolanos apenas consumiram 12. Ou seja: um norueguês consome 35 vezes mais energia que um angolano. Curiosamente, ambos os países dispõem de enormes recursos energéticos, nomeadamente à escala do petróleo convencional.
No que nos diz directamente respeito e que nos interessa sobremaneira, constatamos que, enquanto o consumo mundial per capita apenas aumentou cerca de 10 por cento entre os anos 1980 e 2004, em Portugal aumentou mais de 230 por cento durante o mesmo período. Apesar deste nosso considerável aumento do consumo, ainda ocupamos o 68º lugar no ranking mundial de consumidores, com os nossos 105,5 milhões de Btu per capita. Os consumidores espanhóis ocupam o 44º lugar com 159 milhões de Btu per capita. Mais 50 por cento do que nós.

As previsões para o período 2005-2025 não são muito animadoras quanto ao controlo do aumento global mundial dos consumos de energia primária.

Em termos de energia primária total, para um aumento de 33 por cento da população mundial, prevista para os próximos 20 anos, exige-se um aumento de 55 por cento no abastecimento.

A explosão demográfica aliada à exigência da perpetuação dos altos níveis de vida conseguidos nos países ricos e à legitima pretensão de os atingir, reclamada pelos países pobres, introduziram inusitadas pressões no fornecimento estabilizado e continuado dos recursos naturais à escala mundial. Estas pressões provêm tanto da privação como das dimensões ecológicas do drama populacional, igualmente importantes na nossa concepção do mundo como população global.
O consumo dos recursos disponíveis e indispensáveis à manutenção do conjunto humano, continuou a aumentar, em muitas regiões, em ritmo superior ao aumento populacional.
A grande viragem dá-se em 1967 quando, pela primeira vez, o petróleo ultrapassou o carvão como principal fonte de energia à escala mundial.
O rápido aumento de população exigiu que o petróleo respondesse à pressão e se tornasse na principal fonte mundial de energia comercializável.

Note-se que o sector dos transportes (rodoviários, aéreos e marítimos) consome, actualmente, cerca de 50 por cento da produção mundial, quando, 30 anos antes, só consumia 42 por cento.
As previsões da International Energy Agency é que venha a atingir os 70 por cento em 2025.

Tem sido exercido um grande esforço para conseguir meios de transporte menos “glutões”, ao mesmo tempo que se têm desenvolvido as origens alternativas para geração de energia eléctrica, responsável por uma boa parte dos actuais restantes 50 por cento.

Repare-se que se registou um aumento do consumo de petróleo bruto convencional da ordem de apenas 2 por cento ao ano, no decurso dos últimos 50 anos.
Tendo em conta o aumento populacional e o desenvolvimento económico previstos, as previsões da International Energy Agency para o limiar do ano 2025, apontam para a exigência de um aumento da extracção na ordem dos 30 milhões de barris diários.
Nesta data, estaremos a consumir, cada dia que passa, cerca de 120 milhões de barris!
Deduzimos quem o irá consumir!
Mas donde irá ser extraído e quem o irá gerir?

O substancial aumento da entrega do produto ao mercado envolve prospecção, extracção, transporte e distribuição, a exigir os correspondentes colossais investimentos indispensáveis à sua realização.
As reservas comprovadas têm vindo a aumentar, graças às novas descobertas realizadas ao longo do tempo e que têm sido sucessivamente declaradas, a uma taxa de crescimento próxima da do consumo.
No entanto, é importante sublinhar que o aumento da produção do petróleo bruto convencional foi conseguido à custa do aumento da taxa de extracção em poços de alta rentabilização comercial, dado que a quantidade de poços em actividade tem vindo a ser drasticamente reduzida.
De realçar que, enquanto os Estados Unidos operavam em quase 1.500 existentes no ano 1980, passaram para apenas 560 em 2006. A partir desta data retomaram a actividade em mais alguns deles que tinham sido desactivados e iniciaram-se algumas novas explorações.
Surgiram, porém, novos actores na cena internacional:
A China e a Índia, que comportam cerca de um terço da população mundial e estão dependentes do petróleo para dar continuidade aos seus programas de desenvolvimento.
Estes novos consumidores gigantes sobrepuseram-se às economias industrializadas que foram relegadas para lugar secundário na ordem das prioridades a satisfazer.
Se surgiram novos grandes mercados consumidores dependentes, também surgiu a Rússia a disputar a liderança do mercado à Arábia Saudita, baseada nas suas imensas reservas recentemente activadas, localizadas no Árctico, na margem ocidental dos Urais, na Sibéria Oriental e na Ilha Sacalina.
No entanto, os indicadores Risco País, elaborados pelas agências especializadas, colocam os dois países em situação assaz diferente.
Enquanto a Arábia Saudita é classificada como país de “quite low risk”, a Federação Russa é classificada de “moderately high risk”.
Esta classificação não tem causado grandes dificuldades na captação de investimentos para o programa de desenvolvimento do sector petrolífero russo, tendo em consideração os recentes enormes investimentos realizados neste sector, pelos Estados Unidos, pelo Japão, pela China e até pela própria Arábia Saudita.
Admite-se, como dado adquirido, que ambos os governos são fortemente dependentes dos recursos gerados pelas suas exportações de hidrocarbonetos.
De acordo com as publicações do Fundo Monetário Internacional, enquanto para a Arábia Saudita contribuem com 38 por cento para a formação do seu Produto Interno Bruto, valem apenas 17 por cento para Federação Russa.
A Rússia, hoje considerada superpotência energética, já detém a liderança incontestada do mercado mundial do gás natural com uma quota de 22 por cento, e está em vias de conseguir idêntica posição no mercado do petróleo bruto, dado que pode vir a manter, a muito curto prazo, valores de produção próximas dos 10 milhões de barris diários, o que, na actualidade, corresponde a 12,5 por cento do total mundial produzido.
A actuação das forças do mercado dinamizaram uma transição no sector petrolífero russo que lhe permitiu não só desafiar a OPEP e a Arábia Saudita, como também captar a parte de leão da quota de crescimento da procura chinesa, indiana, japonesa e, eventualmente, até dos Estados Unidos.
Sublinhe-se que a situação actual do sector petrolífero dos Estados Unidos é preocupante, dado que passou de leader do mercado, nos bons velhos tempos, a rapidamente dependente da importação de nada menos do que dois terços das suas necessidades actuais, correspondentes a cerca de 25 por cento do total mundial produzido.

A conjunção das duas situações referidas, ou seja:

· o domínio exercido pela Federação Russa e pela Arábia Saudita, responsáveis por 26 por cento do petróleo entregue ao mercado
e
· a dependência dos Estados Unidos que, com apenas 4,5 por cento da população mundial, absorvem 23 por cento do petróleo entregue no mercado,

levam-nos a reflectir acerca dos riscos de uma actuação concertada eventualmente introduzida por russos e sauditas no sector produtivo e no mercado.

Estes desenvolvimentos conduzem a novos debates acerca do verdadeiro significado da segurança e que tipo de relações duráveis será agora possível estabelecer entre consumidores e produtores, de modo a que possam, a longo prazo, vir a satisfazer os interesses de ambos.
Para terminar, façamos uma rápida análise à evolução dos preços do petróleo bruto leve, dito convencional, ao longo dos últimos anos.
A análise da evolução da produção e abastecimento do petróleo bruto convencional ao mercado, pouco reflecte a variação dos preços.
Exceptuando os períodos que se seguiram aos dois choques petrolíferos, o consumo aumentou a taxas relativamente constantes, independentemente da variação dos preços correntes.
Constatamos, então, que os preços do barril dispararam em quatro ocasiões, devido não a causas imputáveis ao sector produtivo ou ao mercado, mas sim à ocorrência de factos políticos ou, até mesmo ao temor da sua ocorrência a curto prazo.

A primeira aconteceu com o embargo de fornecimentos da OPEP, imposta aos países que apoiaram a política dos Estados Unidos para o Médio Oriente, em 1973, o chamado 1º choque petrolífero.

A segunda deveu-se à ocorrência da revolução iraniana de 1979, que culminou com a deposição do Shah Reza Pahlavi e consequente bloqueio à extracção de petróleo dos seus poços em actividade normal. De seguida deflagrou a Guerra entre o Irão e o Iraque.
Foi o 2º choque petrolífero de consequências muito mais gravosas do que o primeiro.
Contou-se, porém, nessa conjuntura, com a preciosa ajuda da Noruega que passou de uma produção diária de cerca de 500.000 barris para os 3,5 milhões, o que a passou a colocar no importante lugar de terceiro maior exportador mundial de petróleo bruto convencional, posição que ainda ocupa, logo a seguir à Arábia Saudita e à Rússia.

A partir destes factos fortemente influenciadores dos preços, entrou-se num período de relativa estabilização, logo que foi atingido um novo mínimo em 1986.

A terceira ocasião chegou com a invasão do Kuwait pelas tropas iraquianas, em 1990, para voltar a estabilizar pouco depois.

Por último, a grande convulsão provocada pelo abrandamento económico mundial, consequente do ataque terrorista do 11 de Setembro nos Estados Unidos.
A partir desta última ocorrência, exógena ao sector produtivo petrolífero, os preços retomaram a sua tendência altista, a que não são alheios os baixos investimentos realizados durante as décadas de 1980 e 1990, nomeadamente à escala da prospecção e da abertura de novas extracções em bolsas petrolíferas comprovadas.
Enquanto a Arábia Saudita e a Federação Russa dominam e continuarão e dominar o mercado do petróleo convencional (o petróleo leve), a alternativa de continuidade de satisfação da procura constituída pelos petróleos pesados, extra-pesados e betumes, ainda muito modestamente aproveitados, é assumida, na sua quase totalidade, pela Venezuela e pelo Canadá.

Estas 4 superpotências energéticas – Arábia Saudita, Federação Russa, Venezuela e Canadá - poderão vir a constituir o núcleo dominante dos combustíveis hidrocarbonetos à escala mundial.

Não é demais relembrar que, de acordo com as estimativas avançadas pela International Energy Agency, o petróleo convencional disponível no mundo, corresponde, apenas, a 30 por cento do total, cabendo aos petróleos pesados e aos betumes, os restantes 70 por cento
Apesar dos imensos recursos disponíveis, estes só acrescentaram os seus 3 biliões de barris aos mais de 26 biliões de barris de petróleo bruto leve, actualmente produzidos.
O grande óbice à utilização maciça dos petróleos brutos não-convencionais (os pesados, extra-pesados e betumes), reside nos elevados custos de extracção e de processamento.

Recorde-se que o petróleo bruto leve (o petróleo convencional), a caminho de um rápido esgotamento, dispõe de uma característica fundamental inultrapassável:
jazente numa bolsa petrolífera sob pressão, jorra de um furo que atinge a bolsa que o contém, sem necessidade de grandes operações complementares para extracção e processamento ou de tecnologia específica.

Há que considerar que a extracção do petróleo não-convencional exige tecnologia e onerosos acrescidos recursos específicos: água e energia abundantes que garantam a injecção de vapor de água nas jazidas.
São, geralmente upgraded para lhes reduzir os componentes carboníferos ou para lhes adicionar hidrogénio, antes de as entregar às refinarias convencionais.
Os custos adicionais de processamento e upgrading explicam as razões pelas quais o desenvolvimento dos petróleos pesados e betumes ainda se encontra tão limitado.
O aumento das taxas de recuperação de depósitos do petróleo extra-pesado e dos betumes representa o desafio mais importante para que estas reservas se materializem.
No caso da Venezuela, membro da OPEP, já um grande exportador de petróleo bruto convencional, trata-se de petróleo pesado e extra-pesado com o inconveniente de comportar mais enxofre e contaminação de metais pesados que exigem uma muito mais complexa refinação.
Estas reservas venezuelanas, situadas na Faixa Petrolífera do Orinoco, estão estimadas em cerca de 2,2 triliões de barris, correspondendo a 90 por cento do total mundial estimado.
Neste particular, os pesados e extra-pesados venezuelanos beneficiam da localização na região do Rio Orinoco, onde foi construída, nos finais da década de 70, a mega-barragem e a Central Hidroeléctrica do Guri, com uma potência eléctrica instalada de 10.000 MW que disponibiliza abundante energia para a sua extracção e o processamento.
No caso do Canadá, recentemente assumido oil country, trata-se do aproveitamento de areias betuminosas a céu aberto, disponível em grandes quantidades no Athabasca, cujas reservas estão estimadas em cerca de 2,4 triliões de barris, correspondendo a 40 por cento do total mundial estimado.
A produção actual atinge cerca de 1 milhão de barris/dia, prevendo-se que venha a atingir os 3 milhões de barris diários no ano 2020, com previsões de chegar aos 5 milhões diários em 2030.
Para tanto, a Energy Alberta Corporation acaba de lançar a construção de uma central nuclear de reactores gémeos a entrar em serviço em 2016, para garantia do abastecimento da energia eléctrica necessária à extracção e processamento dos betuminosos do Athabasca, operados pela Shell Canada.
Recordo, para terminar esta análise, que os países da União Europeia, dependentes da importação de petróleo, pagaram por ele, o ano passado, cerca de 240.000 milhões de dólares. É evidente que qualquer subida substancial no valor do barril de petróleo provoca grande agitação nas suas economias.
Sublinhe-se que, dispondo apenas de 6,5 por cento da população mundial, contribui com mais de 25 por cento para o PIB total mundial e assegura 35,5 por cento das exportações de mercadorias e 34 por cento das importações registadas à escala mundial.
Contudo, é por demais conhecida a sua dependência no que se refere a combustíveis.
O consumo do conjunto dos países-membros da União Europeia ultrapassa largamente a produção, dado que consomem 6 vezes mais petróleo do que produzem, o dobro do gás natural e 1,8 vezes mais carvão.
Podem considerar-se excepções, a confortável situação da Dinamarca, excedentária tanto em petróleo bruto como em gás natural, suportada pelas reservas disponíveis no Árctico (via Gronelândia) e o equilíbrio mantido pelo Reino Unido.
A nova dimensão de segurança entre nações exportadoras e nações importadoras dependentes desta matéria-prima estratégica, resultará da interligação entre o investimento, a finança e o comércio.
Os produtores procurarão obter dos países consumidores: o capital, a tecnologia e a competência técnica, ao mesmo tempo que abastecerão os seus mercados.
Esta reorientação incitará a um redobrado esforço dirigido à investigação e à detecção de oportunidades, quer de investimento quer de participação no desenvolvimento das estruturas do sector.
Encontramo-nos hoje perante opções a tomar, que não podem continuar a ser adiadas, sob pena de nos vermos, a curto prazo, numa situação de carência generalizada, de consequências muito difíceis de ultrapassar:

· Se os preços do barril de petróleo forem colocados de tal modo baixos que os tornem acessíveis às economias débeis e dependentes da importação do petróleo para satisfazer as suas necessidades energéticas, desmotiva o investimento em novas descobertas e novas produções. Logo, o produto escasseará e provocará tomadas de posição que podem conduzir a conflitos de imprevisível dimensão.
· Se os preços forem colocados a um nível que incite o investimento, corre-se o risco do esmagamento global das economias dependentes, inclusivamente das ocidentais europeias e das norte-americanas.

Aos países extremamente dependentes que não o possam pagar, não restará outra saída que não seja a de optar por energias alternativas: hídrica (se tiverem água), eólica (se tiverem vento) ou biomassa (se tiverem solo arável e água). E fazer um esforço titânico para conseguir manter operacional o seu parque de transportes.
Daí a necessidade imperiosa da racionalização dos consumos do petróleo, da eficiência energética e do crescente recurso à utilização das energias alternativas, quer sejam de origem renovável, quer da controversa origem nuclear.

De uma consequência estamos certos: os custos associados ao cumprimento das exigências ambientais e aos investimentos a realizar nas novas eventuais descobertas de petróleo convencional, nas redes de oleodutos seguros e no desenvolvimento da tecnologia e processamento dos petróleos não-convencionais serão, inevitavelmente endossados aos consumidores.

Contracapa

Quanto petróleo existe no subsolo? Quanto poderá vir a ser possível extrair no futuro? Nunca ninguém soube ou terá a veleidade de tentar inventariar! Mas a delapidação dos recursos petrolíferos é preocupante.
Surgiram, entretanto, novos actores na cena internacional: a China e Índia, que comportam um terço da população mundial e estão dependentes do petróleo para dar continuidade aos seus programas de desenvolvimento. Estes novos consumidores gigantes sobrepuseram-se às economias industrializadas que foram relegadas para lugar secundário na ordem das prioridades a satisfazer.
Com a alteração do naipe de consumidores acabou por emergir a Rússia a liderar o mercado de abastecimento com os seus imensos recursos de gás e petróleo.
O Presidente russo anunciou em Janeiro de 2006 a imediata construção de um oleoduto com capacidade para transportar os 5 mil milhões de barris que irá entregar à China até 2030. Caminhamos para o esgotamento do petróleo convencional.
A alternativa pode estar nos petróleos pesados ou nos sintéticos a partir do carvão, já em produção comercial. Para quem os puder pagar!
O grande obstáculo à utilização maciça destes petróleos não-convencionais reside nos custos da extracção e do processamento. Ambos exigem um grande esforço financeiro de retorno a longo prazo. Sem esquecer as exigências ambientais.
Aos países extremamente dependentes que não os possam pagar não restará outra saída que não seja a de optar por energias alternativas: hídrica (se tiverem água), eólica (se tiverem vento) ou biomassa (se tiverem solo arável e água).
Seremos obrigados a conjugar as várias fontes energéticas disponíveis e utilizá-las racionalmente. No equilíbrio das várias opções a tomar, residirá o bem-estar da civilização tal como a conhecemos.
E a Europa? Continuará Unida em torno desta questão simultaneamente económica, política e social?

Prefácio

“Petróleo, Qual Crise?” é um livro de leitura e estudo obrigatórios para quem queira entender os desafios do presente que condicionam o nosso futuro. José Caleia Rodrigues, imprime, com mão de mestre, o resultado de anos de investigação aturada no terreno, em países estratégicos para a problemática do petróleo, primeiro em Angola e na Venezuela, em funções privadas, depois no desempenho exemplar das suas elevadas funções de Delegado do ICEP e de Conselheiro Comercial das Embaixadas de Portugal em Israel, Marrocos e na Africa do Sul. Apesar de absorvente, o seu trabalho era insuficiente para preencher o seu espírito de estudioso, atento e preocupado com o devir da Humanidade. Assim foi coligindo notas, vendo o que outros não viam, trabalhando, aturadamente e em silêncio, o politicamente incorrecto até o poder expor. Abre-nos, neste seu magnífico livro, o véu do seu imenso conhecimento sobre esta área fulcral para a Humanidade.
A sua mestria é visível ao longo das páginas, porque só escreve de uma forma tão clara e compreensível sobre temas tão difíceis e complexos quem domina completamente a matéria sobre a qual escreve. Este é um livro que todos poderão ler e entender sem esforço. Dirige-se a todos e não apenas à Comunidade Científica ou aos estudiosos deste tema. E bem, porque a procura de soluções para a ultrapassagem deste problema estrutural da escassez da fonte de energia que viabiliza o funcionamento da nossa Sociedade, como a conhecemos, diz respeito a todos e não apenas a uma comunidade restrita de pensadores. O que está em causa, como o autor permanentemente chama a atenção, não é uma crise que, por definição se resolve. É, pelo contrário, um problema estrutural de esgotamento de uma fonte de energia que é finita e que é a base que permite a vida como a conhecemos. Cada um de nós terá um papel fundamental na ultrapassagem deste grave problema porque, a menos que uma nova e barata forma de energia surja, o problema só se resolve com uma mudança radical do nosso modo de vida…de cada um de nós, qualquer que seja o nosso nível de riqueza. Como José Caleia Rodrigues tão bem deixa perceber no título que escolheu, definir a questão petrolífera como uma crise é uma forma perigosíssima de fazer adiar a procura das soluções que de há muito deveriam estar encontradas. A noção de crise é a de que algo grave provocou um desequilíbrio mas que esse desequilíbrio é passageiro. A palavra crise pode ser associada à de paixão: um sentimento muito forte, muito intenso, que provoca a concentração da atenção em um só ponto mas que, por definição, é de curta duração. Aqui o problema é o do consumo, em progressão exponencial, do recurso energético escasso que suporta o nosso modo de vida. O caminho para o esgotamento acelerou-se com o advento da globalização competitiva cujos valores dominantes da eficiência e competitividade ocuparam o lugar deixado vago pelas ideologias e em que a abertura à economia de mercado de países como a Índia, China, Paquistão e Rússia, com mais de um terço da população mundial e taxas de crescimento médio anual próximas dos dois dígitos criam uma pressão fortíssima quer sobre o consumo quer sobre o preço deste recurso energético. José Caleia Rodrigues, ao enunciar o carácter finito do petróleo fácil mostra o caminho para a tomada de consciência de que não só o petróleo é finito como o próprio Planeta é finito. O desígnio da nossa geração, único sustentável, é o de satisfazermos as nossas necessidades de hoje sem pormos em causa a possibilidade de as gerações futuras satisfazerem as suas necessidades amanhã, com qualidade de vida. Por isso, o autor, ao mesmo tempo que mostra as diferentes alternativas energéticas vai sempre chamando a atenção para as questões ecológicas e ambientais que resultariam de explorações in extremis como seriam, por exemplo, as do petróleo do Árctico.
Sem qualquer extremismo ou dogma, este livro é um livro sério, como o é, irrepreensivelmente, o seu autor. Caracteriza o problema, mostra as soluções possíveis, datando-as, isto é, mostrando sempre a sua precariedade ou consequências económicas, ambientais e geo-estratégicas. Não acredita, o autor, no apocalipse mas também não acredita, a menos que um avanço tecnológico decisivo aconteça, numa resolução do problema sem uma alteração substancial do nosso modo de vida, isto é, sem o contributo consciente de cada um de nós.
Este é um livro de características excepcionais, de leitura fácil, de equilíbrio, de esperança no bom-senso da Humanidade e de visão. Grandes razões para a sua leitura como o foram, disso estou certo, para a decisão de a promissora Booknomics o escolher como o seu primeiro livro editado.
António Neto da Silva
Lisboa, 3 de Abril de 2006


Índice

Introdução

Primeira Parte
Da origem utópica à petrodependência

1. Ameaças de natureza económica
Gestão dos recursos naturais
Conflito provocado pela escassez de recursos naturais
OPEP e a Petro-Jihad

2. Porquê o petróleo?
O imparável aumento do consumo
Desesperada procura internacional
Guerra aberta pelo domínio do petróleo do Médio Oriente
Reservas estratégicas

Segunda Parte
Do uso e abuso à inexorável disputa

3. A tomada de poder pela OPEP
O cartel das “sete irmãs”
A OPEP domina o mercado
Lançamento da “arma-petróleo”

4. Primeira deflagração da “arma-petróleo”
Novo factor de poder
As petro-finanças apoiam objectivos políticos
Primeiro embargo e consequente choque petrolífero
O poder devastador dos choques petrolíferos

5. Onde mora o poder?
O dilema americano
A União Europeia cada vez mais dependente
A importância da Noruega no xadrez mundial
Reconcentração das grandes petrolíferas
Rússia ou Arábia Saudita?

Terceira Parte
Das alternativas aos custos a suportar

6. Alternativas de compromisso
Para quando a exploração do Árctico?
Petróleo pesado
Combustíveis líquidos sintéticos
Gás natural: concorrente ou complementar?

7. Pontos quentes
Partilha dos recursos do Mar Cáspio
A encruzilhada afegã
Case study: Água na fogueira do conflito israelo-árabe

8. Constrangimentos a ultrapassar
Megainvestimentos requeridos
Insuficiente capacidade de refinação
Escoamento do produto: As petroestradas
Case study: Ponte energética Este-Oeste

Glossário
Bibliografia


INTRODUÇÃO

Quando ouvimos falar em crise de petróleo deparamo-nos com um perigoso equívoco.
Não parece que esta escassa e finita matéria-prima, ou mesmo o sector petrolífero, estejam a passar por uma crise que, por definição, é transitória. Nada que se possa comparar com boicotes, choques petrolíferos ou consequências de pontuais situações políticas vividas no passado.
Podemos e devemos encarar a situação como consequência natural da desenfreada intensificação e descontrolada massificação da utilização do petróleo bruto convencional, acompanhada por um demasiado longo período em que o investimento não acompanhou a taxa de crescimento da procura.
A explosão demográfica aliada à exigência de perpetuação dos altos níveis de vida conseguidos nos países ricos e à pretensão de os atingir, reclamada pelos países pobres, introduziram aberrantes pressões no fornecimento estabilizado e continuado dos recursos naturais à escala mundial. Estas pressões provêm tanto da privação como das dimensões ecológicas do drama populacional, igualmente importantes na nossa concepção do mundo como população global.
Os analistas são unânimes em concluir que a utilização dos recursos naturais aumentaram de forma exponencial. Grande parte dos recursos disponíveis e indispensáveis à manutenção do conjunto humano, continua a aumentar, em muitas regiões, em ritmo superior ao aumento populacional. Enquanto a população mundial aumentou três vezes e meia desde 1890, a energia industrial consumida per capita, apesar de desigualmente repartida, aumentou mais de sete vezes durante o mesmo período e a energia total consumida a nível mundial aumentou quase catorze vezes.
Estamos perante a emergência de um ciclo complexo. A taxa de natalidade tende a reduzir-se e a estabilizar em países economicamente desenvolvidos, ao mesmo tempo que se exige mais energia para que o nível de bem-estar se mantenha. Nas regiões economicamente menos desenvolvidas, o acréscimo de população faz aumentar a procura que rapidamente absorve a totalidade do adicional de energia e de riqueza conseguidas, consumidas na pura manutenção do nível corrente, exigindo-se, portanto, enormes quantidades de energia para atingir um acréscimo de desenvolvimento económico e de bem-estar.
Não poderemos mais invocar causas unicamente localizadas no cartel dos produtores, já que a história recente tem demonstrado que só são eficazes em determinadas condições conjunturais, se nos lembrarmos do que aconteceu noutros tempos, bem recentes, com o cobre, com o cimento ou com o cacau.
No entanto, o futuro dos países menos desenvolvidos tem constituído uma das mais preocupantes questões apresentadas na nossa era à economia política internacional, sendo entendido que a forma como esta matéria for resolvida, afectará, indubitavelmente, o futuro do nosso planeta. O intenso desejo da maioria da raça humana em escapar à debilitante pobreza e a juntar-se ao mundo economicamente desenvolvido, é objecto determinante da política internacional. Atingiu-se a passagem do século e ainda subsiste grande controvérsia quanto às causas, próximas ou remotas, e ao encontro de possíveis soluções para este confrangedor problema.
Não será demais sublinhar que um Estado se torna politicamente dependente, quando as suas estruturas e instituições de poder são controladas do exterior e economicamente dependente quando as suas exportações e as suas importações são necessárias para a sua sobrevivência.
Situação flagrante de dependência económica é a manifestada por numerosos países, na sua incessante busca de novas e mais seguras origens para a importação de matérias-primas energéticas, indispensáveis à manutenção do seu tecido social e económico.
De uma forma geral e agravante, as relações de natureza funcional entre tecnologia e poder económico, por um lado, e poder político e militar, por outro, viram-se gravemente perturbadas – até se poderia ir mais longe, dizendo que foram, parcialmente, destruídas – pelo uso recente da utilização do petróleo como arma política, já que a resolução da questão energética está intimamente relacionada com as transformações ocorridas na órbita da economia internacional. As rápidas actuações na cada vez maior procura de recursos naturais energéticos por parte dos consumidores internacionais provocaram uma alteração profunda em termos de dependência, conduzindo a economia industrial mundial a depender ainda mais das limitadas fontes de energia.
A energia assumiu uma posição dominante na extensa agenda política económica, demasiado rapidamente para que permitissem ser encontradas vias de estabilização. Não parece difícil admitir que, nas suas várias formas, apresenta-se como sinónimo de desenvolvimento económico e, ainda mais, de riqueza e prosperidade. Consequentemente, o acesso e controlo dos recursos energéticos constituem uma preocupação central dos governantes e de todos aqueles que se encontram envolvidos em processos de produção industrial.
Enquanto o Médio Oriente produziu em 2004, cerca de 31 por cento do petróleo mundial, consumiu apenas 7 por cento. Pelo contrário, o Japão, com enorme escassez de recursos energéticos, produziu cerca de 0,15 por cento do petróleo mundial e consumiu nada menos que 7 por cento. Ou seja, a quantidade consumida pelo Japão é idêntica à consumida pelo conjunto de todos os países do Médio Oriente. Com uma notável diferença: o petróleo consumido pelo Japão é importado e o do Médio Oriente é de recurso próprio.
Como corolário evidente destas contradições, o petróleo tornou-se mercadoria-chave do comércio internacional e quando os consumidores pretenderam voltar a dispor de abastecimento seguro não tiveram outra saída que não fosse a de criar condições sob as quais a “política petroleira” se pudesse desenvolver.
Na realidade, foi devido a esse processo que as políticas petroleiras foram colocadas no topo da agenda política mundial durante os anos 70 e 80. O que fizeram, reflecte a complexa interligação de tendências e acontecimentos em diferentes centros, envolvendo uma diversidade de agentes, tanto estatais, como não-estatais. Por outro lado, as grandes multinacionais petrolíferas, que durante tanto tempo tinham exercido uma dominante influência na indústria petrolífera, foram confrontadas, durante os anos 50 e 60, com a redução de receitas, quando o preço do petróleo desceu. Ao mesmo tempo, o crescendo de nacionalismos no antigamente chamado Terceiro Mundo influenciou a atitude dos Estados produtores de petróleo que começaram a exigir maiores receitas e mais eficaz controlo dos seus recursos petrolíferos. A principal manifestação deste desenvolvimento foi o colossal papel desempenhado pela associação dos maiores produtores exportadores, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), no embargo imposto em 1973.
Tornou-se, rapidamente, bem claro que a OPEP poderia começar a usar o seu reencontrado e renovado poder, actuando nos fornecimentos e nos preços, pondo em risco a segurança económica dos Estados industrialmente desenvolvidos. Poderiam, eventualmente, ter sido usadas políticas macroeconómicas para amortecer as consequências do choque provocado pelo aumento dos preços. Este, por se ter apresentado com tão grande dimensão, fez aumentar os factores de produção em todos os países importadores dependentes
Trinta anos depois do impacto da deflagração da crise de 1973 na política internacional, o petróleo mantém-se como produto estratégico crítico, na esfera do equilíbrio de poder e do equilíbrio político internacional global.
Surgiram, entretanto, novos actores na cena internacional com a emergência económica da China e da Índia que, apesar de consideradas economias em desenvolvimento, contam com um terço da população mundial e estão dependentes do petróleo para a implementação dos seus programas de desenvolvimento. Dada a dimensão dos mercados em jogo, estes grandes novos consumidores sobrepuseram-se às economias industrializadas que passaram a ficar relegadas para um lugar secundário na ordem de prioridades dos mercados dependentes.
Se surgiram novos grandes mercados consumidores dependentes, também surgiu a Rússia a disputar a liderança do mercado abastecedor, baseada nos seus imensos depósitos petrolíferos localizados no Árctico e na Sibéria Oriental, recentemente activados.
Em retrospectiva, os choques dos anos 70 podem ser vistos como o ponto alto do nacionalismo do petróleo. Foi a era em que a economia mundial estava suspensa dos comentários que os Ministros do petróleo deixavam correr nos bastidores das reuniões da OPEP e quando os erros do colonialismo pareciam ter sido correctos. Foi o princípio da “nova ordem internacional”, um “jogo de soma-zero” (game theory) que aspirava a uma redistribuição seriada, riqueza reencaminhada do Norte para o Sul e redução da estatura internacional dos Estados Unidos e das outras grandes potências industriais.
Muito destes acontecimentos já pertencem à história. Os países exportadores de petróleo aprenderam que precisavam mais dos importadores, do que os importadores poderiam precisar deles.
No ano 2003, a exportação de petróleo valeu 38,3 por cento do PIB da Arábia Saudita, 65,3 do PIB de Angola, 38,4 do PIB do Iraque e 96,6 do PIB da Guiné Equatorial. Mas só valeu 17 por cento do PIB da Rússia e 19,8 do PIB do Irão.
Pelo visto, não é demais sublinhar que grande parte dos principais abastecedores do mercado mundial de hidrocarbonetos estão tanto ou mais reféns das suas vendas de petróleo do que algumas das maiores economias industrializadas estão dependentes do seu abastecimento.
Estes desenvolvimentos conduzem a novos debates acerca do verdadeiro significado da segurança e que tipo de relações duráveis será agora possível entre consumidores e produtores, de modo a que possam, a longo prazo, vir a satisfazer os interesses de ambos. A Guerra do Golfo ilustra, igualmente, tanto o crítico posicionamento do petróleo no equilíbrio de poder global, como a importância da interdependência entre produtores e consumidores industrializados.
O consumo de energia apresentou um ligeiro decréscimo desde o início da década de 1980, em parte devido a medidas efectivas de conservação (especialmente na Europa e no Japão) mas também consequência do abrandamento do desenvolvimento económico verificado desde então. Dado que este último parâmetro, por razões óbvias, não se eterniza, e conscientes da possibilidade de novos choques petrolíferos em termos de acentuado agravamento dos preços de mercado e da imposição de reduções de fornecimento, será imprescindível encontrar novas fontes e novas formas de conservação de energia.
Note-se que o sector dos transportes (rodoviários, aéreos e marítimos) consumiu quase 60 por cento da produção mundial de petróleo, em 2003. Tem-se exercido um grande esforço para conseguir meios de transporte menos “glutões”, ao mesmo tempo que se têm desenvolvido as origens alternativas para geração de energia eléctrica, responsável por grande parte dos restantes 40 por cento.
Contudo, a delapidação dos recursos globais é excessivamente desigual e a distribuição dos recursos naturais vitais não é equitativa nem razoável.
As disponibilidades são abundantes, mas apresentam-se desigualmente distribuídas entre países e povos, mesmo dentro das suas próprias fronteiras políticas, estas raramente coincidentes com fronteiras naturais.
Enquanto o aumento do conjunto populacional do mundo economicamente menos desenvolvido induz consumo de recursos é, contudo, nos países economicamente desenvolvidos que se verifica maior delapidação. Os actuais padrões de produção e de distribuição vigentes nos países ditos industrializados, muito provavelmente não poderão continuar a ser mantidos por muito mais tempo e a tendência para a imitação por parte dos restantes irá causar irreparáveis danos ecológicos.
As estratégias a implementar a curto e a médio prazo obrigarão, inevitavelmente, à vivência de um longo e penoso período de transição. Transformações básicas poderão ter que ser implementadas na utilização dos recursos e na substituição dos recursos exauridos, simultaneamente com mudanças a introduzir a nível dos usos e costumes, quer sejam em base individual, de grupo, empresarial, social, regional ou até mesmo à escala do sistema internacional global.
Um grupo de pessimistas, composto maioritariamente por muito respeitados geólogos, físicos e financeiros, prevê uma espécie de apocalipse, seguindo uma teoria da conspiração ou afirmando peremptoriamente que a civilização, tal como a conhecemos, está atingindo um rápido fim. È esta a razão de ser dos pessimistas individualmente conservadores que se apresentam absolutamente terrificados com uma teoria bem defendida designada globalmente como “peak oil”. Ou seja, a produção mundial partiu de um baixo montante verificado na década de 1950, atingiu o seu máximo à volta do ano 2000 e atingiria de novo, um mínimo idêntico, à volta do ano 2050. Cerca do ano 2020 voltaria aos níveis de 1980, numa simetria de declínio matematicamente correcta, do seu ponto de vista.
Sem pessimismos exagerados, temos, porém, que aceitar um facto incontestável: o primeiro trilião de barris disponíveis desde as primeiras descobertas em Baku e na Pensilvânia, em finais do século XIX, foi consumido nos primeiros 125 anos e bastarão apenas 30 anos para consumir o segundo trilião.
É evidente que se trata de um produto finito que constitui uma origem de energia não renovável, mas um tal tipo de previsão a 50 anos nesta matéria mais parece profecia de apocalipse bíblico do que reflexão que considere todos os outros parâmetros de ordem económica, tecnológica e de investigação.
Efectivamente a situação criada pela delapidação dos recursos petrolíferos é preocupante. Basta reparar, apoiando-nos apenas nos grandes números, que a produção mundial anual de petróleo bruto convencional foi de quase 17 biliões de barris no ano de 1970, para atingir mais de 26 no ano 2004, correspondendo a um aumento anual de 50 por cento no curto espaço de 34 anos.
As previsões da Energy Information Administration (EIA) apontam para um consumo da ordem dos 43 biliões de barris em 2025. Mais 20 anos, mais 65 por cento.
Tendo em atenção que as reservas comprovadas do petróleo bruto convencional rondam os 1.200 biliões de barris, atingir-se-ia a sua extinção dentro de um curto espaço de 26 anos. Isto se o consumo mundial estagnasse e não se comprovassem mais reservas ainda em fase de análise. Mas não parece verosímil que se chegasse a atingir um consumo de tais quantidades a poucos anos da extinção do produto, dentro do quadro de reservas actualmente comprovadas.
Neste contexto, exige-se a prospecção e inventariação de novas bolsas tecnicamente possíveis de exploração e economicamente viáveis, nomeadamente ao nível do petróleo não-convencional constituído pelos betumes, xistos betuminosos, petróleos pesado e extra-pesado, disponíveis em grandes quantidade no Canadá e na Venezuela, ou mesmo a obtenção de combustíveis líquidos a partir da sintetização do carvão. O que exige um esforço financeiro verdadeiramente notável.
As opções tomadas em relação ao gás natural e à energia de origem nuclear não apresentaram, de início, perspectivas muito animadoras. A primeira devido às ligações de demasiada dependência entre o produtor e o consumidor, e a segunda pela dificuldade resultante dos elevados custos de instalação das infra-estruturas técnicas, enriquecimento do urânio e à exigência de enorme investimento inicial associado à reduzida dimensão dos mercados nacionais dos países menos desenvolvidos, sem poder esquecer o drama ambiental. A alternativa apresentada pelo carvão, também não se mostrou capaz de resolver todas as dificuldades enfrentadas pelos países dependentes, atendendo a que não contemplava todas as utilizações até então prestadas pelo petróleo, nomeadamente a de combustível líquido.
Porém, o tempo que foi de decorrendo e a exaustão dos recursos disponíveis forçaram à orientação para fontes energéticas até então relegadas para segundo plano de prioridades a accionar no sector petrolífero.
Comecemos pelo lote de constrangimentos com que este sector se debate e vejamos de seguida as opções que se apresentam disponíveis.
Uma das maiores dificuldades que a indústria petrolífera enfrenta na actualidade, está relacionada com o terrorismo internacional e com as acções dos activistas locais que ameaçam a actividade petrolífera em qualquer dos domínios da fileira: poços e plataformas de extracção, pipelines e vias marítimas de transporte, refinarias ou depósitos de produtos refinados.
O aumento de riscos sofridos por perturbadora ocorrência conjuntural levou muitas empresas a implementar o seu próprio sistema de defesa quando actuam em ambientes hostis e em que as forças de segurança locais são consideradas ineficazes. As petrolíferas deparam com riscos acrescidos quando se deslocam para regiões mais instáveis em busca de novos recursos. Tem sido largamente publicitado que os gestores das empresas têm que negociar com raptores e movimentos guerrilheiros em África e na América Latina, ou enfrentar a ameaça de ataques terroristas no Médio Oriente e na Ásia Central.
Podem adicionar-se a este tipo de ameaças os actos de pirataria no Estreito de Malaca, uma das mais importantes rotas marítimas de transporte de hidrocarbonetos.
No conjunto de constrangimentos a ultrapassar, procede, porém, a considerável questão de como conciliar o continuado aumento da utilização da energia de origem nos hidrocarbonetos com os imperativos ecológicos e ambientais. Caso paradigmático é o conflito de interessas inerentes à manifesta vontade de extracção dos imensos recursos disponíveis no Árctico ou a construção premente e urgente de novas e mais adequadas refinarias. Continua-se esperando pelo fim das situações ainda não resolvidas na partilha do Mar Cáspio e na encruzilhada vivida no Afeganistão, apenas possíveis de tratar na arena política internacional.
A questão dos oleodutos é fundamental. Numerosos países que dispõem de vastas reservas comprovadas estão impedidos de exportar as suas potenciais produções por não disporem das exigíveis fontes de escoamento, resolúvel pela simples implementação de oleodutos, a que se agrega, nalguns casos, instalações portuárias adequadas.
Em grande parte dos casos, os oleodutos ligam um ponto de produção a um mercado consumidor. Ponto a ponto. Qualquer acção terrorista num qualquer tramo do oleoduto, bloqueia completamente o fluxo de abastecimento. Esta situação poderá vir a ser resolvida com a implementação de uma rede primária interligada em malha (anéis), semelhante ao que foi concebido para a energia eléctrica, para que quando surja uma situação de bloqueio num oleoduto (ramal) seja possível a continuidade de fornecimento através da rede interligada. Os elevadíssimos custos a suportar têm impedido tal qualidade de garantia de abastecimento seguro e continuado.
No que se refere aos produtos disponíveis, ainda não globalmente desenvolvidos, destacam-se os petróleos não-convencionais e os combustíveis líquidos a partir da sintetização do carvão natural, uns e outros muito abundantes em reservas já comprovadas.
O grande óbice à utilização maciça dos petróleos não-convencionais reside nos custos de extracção e de processamento. No que se refere à sintetização do carvão os custos de processamento são elevadíssimos. Ambos exigem um grande esforço financeiro de retorno a longo prazo.
Recorde-se que o petróleo convencional (leve) a caminho de um rápido esgotamento dispõe de uma característica fundamental inultrapassável: existente num jazigo petrolífero sob pressão, jorra de um furo que atinge a bolsa que o contém, sem necessidade de grandes operações complementares para extracção e processamento ou de tecnologia específica. Daí o seu baixo custo operacional que, na maioria dos casos, se situa entre os 2 e os 10 dólares por barril. Enquanto o petróleo bruto convencional atinge taxas de “energia obtida/energia investida” de cerca de 30 para 1, o retorno nos betumes e petróleos pesados só atinge a taxa de 1,5 para 1. Conclui-se que é preciso gastar 20 vezes mais energia para gerar a mesma quantidade de petróleo não-convencional do que a gasta na obtenção do petróleo convencional.
A indústria petrolífera global, requererá muito mais elevados níveis de investimento do que durante o passado recente, para compatibilizar a satisfação da procura com as exigências ambientais.
A nova dimensão de segurança entre nações exportadoras e as empresas petrolíferas, surgirá da interligação do investimento, do comércio e da finança. Os produtores procurarão obter dos países consumidores: o capital, a tecnologia e a competência técnica, ao mesmo tempo que abastecerão os seus mercados. Esta reorientação mobilizará o investimento requerido pelo desenvolvimento de fornecimentos para o próximo futuro.
Seremos obrigados a conjugar as várias fontes energéticas alternativas disponíveis, utilizá-las racionalmente e optar por ambiente mais limpo ou manutenção do desenvolvimento económico. No equilíbrio das várias opções a tomar, residirá o bem-estar da civilização, tal como a conhecemos.
E os custos associados ao cumprimento das exigências ambientais e aos investimentos a realizar nas novas eventuais descobertas de petróleo convencional, nas redes de oleodutos seguros e no desenvolvimento da tecnologia e processamento dos petróleos não-convencionais serão, inevitavelmente repercutidos nos consumidores.