domingo, 12 de julho de 2009

Observadores acreditam que a energia é um perigo enorme para a retoma

Faz amanhã um ano que o petróleo atingiu 147 dólares por barril, o valor mais alto de sempre. Hoje, o valor da matéria -prima, da qual Portugal (e tantas outras economias) depende de forma esmagadora, está 58% mais barato. Haverá razões para sorrir de alívio? A evolução dos mercados mostra que não: desde o mínimo (35 dólares) de finais de Dezembro de 2008, o barril de petróleo Brent já subiu mais de 70%. Para os especialistas a resposta também é "não": defendem que nada de fundamental mudou na capacidade de oferta (produção); e que, quando vier a retoma, voltarão os mesmo problemas de excesso de procura e desperdício elevado que, no passado, ajudaram o ouro negro a vencer recordes.
É consensual entre os economistas que a actual crise está a ser tão violenta que irá mudar a face das economias: estas voltarão a crescer, sim, mas sem a pujança do passado. Mas será assim com o petróleo? Estarão definitivamente afastadas convulsões como o bloqueio dos camionistas portugueses que em Junho de 2008 deixaram secar bombas de gasolina por todo o país? O preço da comida, que precisa de percorrer terra e mar até chegar à mesa, ficará estável? E o plástico dos brinquedos e dos computadores, continuará a ser barato?
Parece que não. Luís Mira Amaral, professor do Instituto Superior Técnico e ex-ministro da Indústria, acredita que só haverá alguma paz nas cotações do petróleo no "curto a médio prazo" (ver entrevista na página seguinte).
O Fundo Monetário Internacional (FMI) mostrou recentemente que o custo do petróleo não vai esperar por grandes expansões económicas: o preço médio da matéria prima deverá disparar 23% em 2010, essencialmente à boleia da China e Índia, apesar da zona euro continuar em recessão (-0,3%) e dos Estados Unidos crescerem apenas 0,8%.
A tese que hoje corre é simples: o mundo industrializado, dos Estados Unidos à China, não muda de hábitos de um dia para o outro. Nem de uma década para a outra. Mesmo com mais esforço nas energias renováveis e com mais consumo eficientes e inteligente, a dependência é "estruturalmente enorme", defende Matthew Simmons, presidente da Simmons & Co. Internacional, um banco de investimento especializado no sector energético.
Aliás, Portugal é disso exemplo: segundo dados da BP para 2008, estruturalmente o perfil de consumo pouco mudou: 80% da energia consumida - petróleo e gás natural - é importada.
O consultor e escritor de livros sobre energia, que trabalha a partir de Houston, Texas, acredita que os preços hoje praticados no mercado do petróleo "estão a abrir caminho para algo muito perigoso daqui a alguns meses". O quê? "Um novo choque petrolífero", acredita. A tese é que os preços baixos (a média diária deste ano está em 52,5 dólares) não chegam para financiar novos investimentos, nem modernizar as estruturas de produção existentes, nem contratar pessoas. E depois há ainda o travão do acesso ao crédito: com a crise financeira, o dinheiro tornou-se definitivamente um bem mais raro e caro.
José Caleia Rodrigues, consultor de empresas petrolíferas, subscreve esta tese. "Há vários factores que explicam a necessidade de preços mais altos: o petróleo que existe está cada vez mais longe e difícil trazer para cima, a crise representa uma dificuldade acrescida ao financiamento de tecnologias mais sofisticadas e caras, há falta de pessoas qualificadas nestas áreas. Hoje é tudo mais difícil para chegar à mesma quantidade de petróleo. E o difícil é caro. Os preços actuais do petróleo desincentivam mais investimentos".
Na cimeira do G8, que hoje acaba, França e Reino Unido pugnaram por uma acção mais firme dos governos contra a especulação no petróleo. Querem limitar a volatilidade nas cotações, um propósito também partilhado pela administração Obama. A Rússia, um importante produtor de crude e gás, avisou que isso vai ser "impossível".

Jornal i
por Luís Reis Ribeiro, Publicado em 10 de Julho de 2009

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Artigo de opinião (autohoje, 3.Julho.2009)

O consumo mundial de petróleo tem aumentado a uma taxa próxima dos 2 por cento ao ano, até que as grandes bolsas petrolíferas, há longo tempo em exploração, começaram a atingir taxas de esgotamento tão importantes que poderão mesmo vir a pôr em risco o corrente abastecimento do mercado. Os efeitos causados pelo galopante esgotamento das bacias em exploração, poderão assumir dimensões potencialmente devastadoras.
Numa situação desta natureza, as consequências da diferença entre oferta possível e procura exigida serão, sem sombra de dúvida, muito maiores que o considerado admissível, à luz da segurança e da soberania nacionais.
Apesar de alguma retoma, o recente aumento de novas descobertas não tem correspondido ao aumento da procura, o que leva a considerar a hipótese da eventual existência de períodos de carência de abastecimento a curto prazo.
A acentuada e rápida descida dos preços verificada a partir do mês de Julho de 2008 não se ficou a dever às boas razões esperadas. Não foi motivada pelo aumento da produção ou da tão desejada eficiência energética. Deveu-se, outrossim, à redução da procura que acompanhou a redução da actividade económica nas principais regiões industrializadas. Logo, tudo leva a crer que, mal passada as causas que a motivaram, regresse, em força, a pressão sobre a oferta.
Há que ter em conta que a exploração de novas bolsas petrolíferas exige tecnologia e onerosos recursos específicos. Terão que ser exploradas mais longe, mais fundo e mais caro. De salientar que a futura geração de energia requererá níveis de investimento muito mais elevados do que os aplicados no passado, para compatibilização da satisfação da procura com as exigências ambientais, a descarbonização dos produtos energéticos e o acréscimo dos custos resultantes da implementação de reforçados sistemas da segurança das instalações de extracção e de transporte.
À quase estagnação de investimento registada na década de 1990 seguiu-se uma outra, aparentemente de ainda maior dimensão, a partir de 2006. O conjunto de anúncio de cancelamento de projectos e de “adiamentos por período indeterminado” tem aumentado de forma crescentemente preocupante. Porém, grande parte dos projectos que não arranquem no imediato, não estarão prontos para entrar em serviço em 2012-2013, prazo que tem sido considerado como limite para manutenção dos actuais níveis de produção mundial. Mas as dificuldades de captação do indispensável financiamento, a que se associa uma generalizada crise de confiança e de incerteza em relação à retoma económica global, não nos permitem atingir um grau de optimismo que nos tranquilize quanto à exigível garantia da continuidade de abastecimento.
J. Caleia Rodrigues
Analista e consultor dos mercados energéticos