domingo, 11 de maio de 2008

Petróleo (Diário de Notícias, Editorial, 17.Abril.2006)

Os ciclos civilizacionais têm na energia a força motriz do seu triunfo e decadência. Foi o que aconteceu com o trabalho escravo no Império Romano e com o carvão na Revolução Industrial inglesa. É o que acontece com o petróleo no nosso tempo.
Caleia Rodrigues, um especialista no sector petrolífero, diz nesta edição em entrevista ao Economia que a barreira dos 100 dólares por barril poderá ser atingida muito rapidamente. Chegámos há poucos dias aos 70 dólares e o autor de Petróleo: Qual Crise? considera que os preços "nunca mais irão sofrer descidas significativas. Irão subir gradualmente e sem limite. Até porque quem tem recursos petrolíferos vai jogar com eles".
Caleia Rodrigues é um gestor e consultor experiente, trabalhou em Angola e na Venezuela e conhece bem a geopolítica do petróleo. A partir de agora não temos apenas de ponderar quantas décadas demoraremos a esgotar o principal recurso energético do nosso tempo. Vivemos num tempo de grande instabilidade: terrorismo e ameaças nucleares conjugam-se com mais ou menos dificuldade de abastecimento de petróleo. Irão, Nigéria, Rússia ou Venezuela condicionam os fluxos de distribuição. Isto numa altura em que a procura de economias emergentes como a China e a permanente sede americana ajudam ao disparar dos preços. A pressão da procura é enorme e, mesmo tendo em conta que ainda haverá muito petróleo para explorar, o consumidor vai ser muito penalizado a partir de agora.
Portugal é um país energeticamente muito vulnerável. Os canais de abastecimento são pouco diversificados, investimos pouco na participação em blocos produtores, o mesmo se diga em energias alternativas aos combustíveis fósseis. Consequência? Segundo Caleia Rodrigues, podemos vir a não ter dinheiro para suportar o preço do petróleo a que se vai chegar. Não é a médio prazo, é já a partir de agora.
Que fazer? A receita é tão conhecida como pouco praticada. Racionalizar os gastos, diversificar os canais de abastecimento convencional, investir em energias naturais alternativas e investir na inovação tecnológica. Mais do que a procura da eficiência, devemos guiar-nos, como diz Jeremy Rifkin, pela suficiência, pela sustentabilidade, que combata o descartável. O autor de Economia do Hidrogénio lembra a metáfora italiana da construção das catedrais de Roma: gastaram muito tempo, muito dinheiro, muito trabalho e muita energia, mas continuam aí e durarão ainda muitos séculos, ao passo que muitas construções se fizeram de modo eficiente em semanas e se desfizeram em outras tantas. A suficiência e o investimento em energias alternativas deviam mobilizar Portugal e a União Europeia. Uma comunidade que começou por unir-se em torno do carvão e do aço, que nunca teve uma política para o petróleo e que tarda em perceber o que deve fazer no futuro.