sábado, 1 de março de 2008


Comecemos por evidenciar a dependência económica configurada por numerosos países, na sua incessante busca de novas e mais seguras origens de bens energéticos, indispensáveis à manutenção do seu tecido socio-económico.

As populações reclamam o direito à energia!

De forma mais equitativa e mais razoável.

Porém, quer a Carta da Organização das Nações Unidas (1945) quer a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) são omissas quanto a esse direito.
Para culminar a questão, a Resolução 1803 (1962), da Assembleia Geral das Nações Unidas, atribuiu a soberania permanente sobre os recursos naturais aos povos das nações em cujo território se encontrem. Quer em terra firme, quer em águas territoriais atribuídas.

O princípio de soberania permanente sobre recursos naturais, garante primário do poder económico, começou a ser reclamado no início dos anos cinquenta, com o objectivo de justificar a revogação ou a alteração dos termos das concessões detidas por empresas estrangeiras, às quais tinham sido assegurados os mais amplos direitos de extracção de petróleo ou de minerais, em territórios dos Estados adjudicantes.
Estas concessões foram consideradas “não equitativas”, por serem marcadamente mais vantajosas para o concessionário estrangeiro do que para o Estado adjudicante, ou terem sido concedidas em resultado de coação ou abuso de influência.
A Declaração do Princípio da Soberania Permanente, como passou a ser conhecida, despontou no decurso do processo de descolonização e os novos Estados independentes sentiram-se no direito de reavaliar e alterar os acordos legais “não equitativos” sob forma de concessões, herdados do período colonial durante o qual os investidores estrangeiros (maioritariamente empresas multinacionais com as suas sedes no país metropolitano) tinham podido dispor de direitos de exploração dos recursos naturais encontrados dentro dos seus territórios.

A alteração, passou a poder ser efectuada, pelo exercício de:

· o direito de nacionalizar, isto é, de tomar os direitos detidos pelo investidor estrangeiro;
· o direito de alterar certos termos dos acordos
ou
· denunciar um acordo estabelecido com o investidor estrangeiro.

As novas estruturas, não só proporcionaram maiores receitas, como também possibilitaram aos Estados assumir a propriedade dos seus próprios recursos e mecanismos associados, há tanto tempo ambicionados, tanto para o desenvolvimento das capacidades nacionais, como para lhes permitir assegurar um efectivo controlo das operações.

Esta nova Ordem suscitou o aparecimento e o desenvolvimento de colossais empresas nacionais que actualmente dispõem de enormes recursos, quer financeiros quer em capacidade produtiva, de tal monto que podem mesmo vir a ameaçar a já fragilizada posição detida pelas majors, a curto ou a médio prazo.
Numa curta análise, podemos constatar, baseados nos elementos disponíveis caracterizadores das maiores empresas petrolíferas mundiais, como as nacionais dominam hoje a produção, continuando a ficar nas mãos das majors a liderança da refinação e da comercialização.

Se bem que a soberania permanente sobre recursos naturais, seja actualmente reconhecida como princípio fundamental do direito internacional, a precisa definição do seu alcance e implicações permanece uma tarefa jurídica de grande importância, não só porque se trata de um princípio que está passando por sucessivas adaptações, mas também porque continua a ser uma fonte embrionária donde emanam regras para salvaguarda dos interesses dos países em desenvolvimento, sobretudo no que se refere à utilização dos seus recursos naturais.
Ao abrigo deste princípio, uma Nação, mesmo de reduzida dimensão económica e territorial, mas que disponha de invulgar abundância de recursos naturais, pode vir a desfrutar de alto rendimento nacional, independentemente do seu estádio de desenvolvimento.
Bons exemplos a referir, podem ser os do Kuwait ou da Arábia Saudita, que têm conseguido atingir altos rendimentos per capita há décadas, graças à abundância do petróleo existente nos seus territórios.
Repare-se, igualmente, que o valor das exportações do petróleo angolano já vale 65 por cento do seu PIB nacional.
Porém, a exagerada dependência dos recursos naturais pode conduzir a situações de muito difícil solução, como são as relacionadas com o seu esgotamento, encaminhamento dos mercados clientes para outras origens ou, até mesmo, ao aparecimento de tecnologias que possam reduzir ou eliminar a necessidade desses recursos.
Em face deste panorama e do Direito Internacional Público, seremos obrigados a conjugar as várias fontes energéticas alternativas disponíveis, utilizá-las racionalmente e compaginar ambiente mais limpo com desenvolvimento económico.
No equilíbrio das várias opções a tomar, residirá o bem-estar da civilização, tal como a conhecemos.
A futura geração de energia requererá níveis de investimento muito mais elevados do que durante o passado recente, para compatibilização da satisfação da procura com as exigências ambientais, a descarbonização dos produtos energéticos e o acréscimo dos custos resultantes da implementação de reforçados sistemas da segurança das unidades de produção e de transporte.
Em termos de energia primária total consumida à escala mundial, o sector ainda se encontra dependente do recurso aos combustíveis fósseis, na ordem dos 88 por cento.

Acresce a insegurança da continuidade do regular abastecimento, não só por causas exógenas e endógenas ao sector dos combustíveis fósseis, sobretudo no que se refere ao petróleo bruto convencional, mas também pelos elevados riscos país, analisados e divulgados pelas entidades seguradoras.

Encontrámo-nos hoje, aqui, para analisar a envolvente deste produto comercializável que cairia na esfera do marketing internacional, logo sujeito às leis do mercado da oferta e da procura, se não se tivesse tornado preponderante produto estratégico.
O que o torna estratégico é a sua influência na soberania e na segurança nacionais.
Contrariamente aos mais tradicionais aspectos de segurança dirigidos às ameaças que vêm do exterior, muitos dos correntes acontecimentos que tocam na segurança nacional, enfatizam o aumento das ligações entre o domínio doméstico e o internacional.

Para tanto, basta ver como as expectativas económicas são cada vez mais realçadas pelas populações e como, frequentemente, não podendo ser encontradas nos próprios recursos do Estado, ao ser exigidas aos Governos e não encontrando suficiente satisfação, podem criar instabilidade interna e consequente aumento da insegurança.

Não posso deixar de sublinhar que quando ouvimos falar em crise de petróleo deparamo-nos com um perigoso equívoco.
Nem parece que esta escassa e finita matéria-prima, ou mesmo o sector petrolífero, estejam a atravessar uma crise que, por definição, é transitória. Nada que se possa comparar com boicotes, choques petrolíferos ou consequências de situações políticas pontuais, como algumas vividas no passado.
A situação aparenta um fim de ciclo que se caracterizou por uma suficiente capacidade extractiva disponível no sector e um continuado e regular abastecimento ao mercado.
Podemos enumerar a acumulação de constrangimentos exógenos a que o sector foi sujeito, de entre os quais se podem salientar:

· a duplicação da população mundial tendente para explosão demográfica, dado que passou dos 3 para os mais de 6 mil milhões de habitantes em apenas 40 anos,
· o aumento desmesurado do consumo de combustíveis fósseis
e
· as constantes e sucessivas pressões geopolíticas que têm colocado o sector petrolífero em permanente instabilidade.

Mas também encontramos muitos factores dentro do próprio sector, que lhe provocaram grandes constrangimentos, como seja:

· a escassez da oferta,
· o encerramento de inúmeros poços de extracção, não totalmente substituídos por outras novas explorações,
· o sector da refinação ter sido submetido a idêntico processo, nalguns casos devido à exigência de adaptação ás novas regras ambientais. Enquanto, no início da década de 1980 se dispunha de uma capacidade de refinação superior ao consumo em cerca de 25 por cento, situa-se, actualmente, em valores muito próximos dos do consumo.
Ou seja, o sector da refinação dispõe apenas, actualmente, de uma margem mínima de capacidade para acomodar mais aumentos de produto a entregar ao mercado.
e
· o arrefecimento do investimento durante as décadas de 1980 e 1990, em toda a cadeia petrolífera, desde a sondagem e detecção de novas bolsas, abertura de novas extracções até à construção de novas e mais adequadas refinarias.

A energia assumiu uma posição dominante na extensa agenda política económica, demasiado rapidamente para que permitissem ser encontradas vias de estabilização.
Apresenta-se, nas suas várias formas, como símbolo de desenvolvimento económico e, ainda mais, de riqueza e prosperidade.
Consequentemente, o acesso e o controlo dos recursos energéticos constituem uma preocupação central dos governantes e de todos aqueles que se encontram envolvidos em processos de produção industrial.
Contudo, a delapidação dos recursos globais tem sido excessivamente desigual e a distribuição dos recursos naturais vitais, não é equitativa nem razoável.
As disponibilidades são abundantes, mas apresentam-se desigualmente distribuídas entre países e povos, mesmo dentro das suas próprias fronteiras políticas, raramente coincidentes com fronteiras naturais.

Enquanto o aumento do conjunto populacional do mundo economicamente menos desenvolvido induz o aumento do consumo de recursos, é nos países economicamente desenvolvidos que se verifica maior delapidação.

Os actuais padrões de produção e de distribuição vigentes nos países ditos industrializados, muito provavelmente não poderão continuar a ser mantidos por muito mais tempo e a tendência para a imitação por parte dos outros irá causar irreparáveis danos ecológicos.
As actuações na incessante procura de mais recursos energéticos pelos grandes consumidores, provocaram profundas alterações, que forçaram a economia industrial mundial a depender ainda mais das limitadas fontes de energia.
Se não, vejamos: quando a população mundial atingiu os 4 mil milhões de habitantes no início da década de 1970, o consumo mundial de energia era de 5.500 milhões de toneladas equivalentes de petróleo.
A população aumentou 50 por cento até ao final do século, mas o consumo da energia quase duplicou.
Mesmo assim, a resposta energética ainda não satisfez as expectativas de melhoria das condições de vida e do esperado desenvolvimento económico à escala global.
Não é demais repetir que o consumo de energia não é equitativo nem razoável.
À guisa de exemplo, note-se que os noruegueses consumiram 424 milhões de Btu per capita em 2004, enquanto os angolanos apenas consumiram 12. Ou seja: um norueguês consome 35 vezes mais energia que um angolano. Curiosamente, ambos os países dispõem de enormes recursos energéticos, nomeadamente à escala do petróleo convencional.
No que nos diz directamente respeito e que nos interessa sobremaneira, constatamos que, enquanto o consumo mundial per capita apenas aumentou cerca de 10 por cento entre os anos 1980 e 2004, em Portugal aumentou mais de 230 por cento durante o mesmo período. Apesar deste nosso considerável aumento do consumo, ainda ocupamos o 68º lugar no ranking mundial de consumidores, com os nossos 105,5 milhões de Btu per capita. Os consumidores espanhóis ocupam o 44º lugar com 159 milhões de Btu per capita. Mais 50 por cento do que nós.

As previsões para o período 2005-2025 não são muito animadoras quanto ao controlo do aumento global mundial dos consumos de energia primária.

Em termos de energia primária total, para um aumento de 33 por cento da população mundial, prevista para os próximos 20 anos, exige-se um aumento de 55 por cento no abastecimento.

A explosão demográfica aliada à exigência da perpetuação dos altos níveis de vida conseguidos nos países ricos e à legitima pretensão de os atingir, reclamada pelos países pobres, introduziram inusitadas pressões no fornecimento estabilizado e continuado dos recursos naturais à escala mundial. Estas pressões provêm tanto da privação como das dimensões ecológicas do drama populacional, igualmente importantes na nossa concepção do mundo como população global.
O consumo dos recursos disponíveis e indispensáveis à manutenção do conjunto humano, continuou a aumentar, em muitas regiões, em ritmo superior ao aumento populacional.
A grande viragem dá-se em 1967 quando, pela primeira vez, o petróleo ultrapassou o carvão como principal fonte de energia à escala mundial.
O rápido aumento de população exigiu que o petróleo respondesse à pressão e se tornasse na principal fonte mundial de energia comercializável.

Note-se que o sector dos transportes (rodoviários, aéreos e marítimos) consome, actualmente, cerca de 50 por cento da produção mundial, quando, 30 anos antes, só consumia 42 por cento.
As previsões da International Energy Agency é que venha a atingir os 70 por cento em 2025.

Tem sido exercido um grande esforço para conseguir meios de transporte menos “glutões”, ao mesmo tempo que se têm desenvolvido as origens alternativas para geração de energia eléctrica, responsável por uma boa parte dos actuais restantes 50 por cento.

Repare-se que se registou um aumento do consumo de petróleo bruto convencional da ordem de apenas 2 por cento ao ano, no decurso dos últimos 50 anos.
Tendo em conta o aumento populacional e o desenvolvimento económico previstos, as previsões da International Energy Agency para o limiar do ano 2025, apontam para a exigência de um aumento da extracção na ordem dos 30 milhões de barris diários.
Nesta data, estaremos a consumir, cada dia que passa, cerca de 120 milhões de barris!
Deduzimos quem o irá consumir!
Mas donde irá ser extraído e quem o irá gerir?

O substancial aumento da entrega do produto ao mercado envolve prospecção, extracção, transporte e distribuição, a exigir os correspondentes colossais investimentos indispensáveis à sua realização.
As reservas comprovadas têm vindo a aumentar, graças às novas descobertas realizadas ao longo do tempo e que têm sido sucessivamente declaradas, a uma taxa de crescimento próxima da do consumo.
No entanto, é importante sublinhar que o aumento da produção do petróleo bruto convencional foi conseguido à custa do aumento da taxa de extracção em poços de alta rentabilização comercial, dado que a quantidade de poços em actividade tem vindo a ser drasticamente reduzida.
De realçar que, enquanto os Estados Unidos operavam em quase 1.500 existentes no ano 1980, passaram para apenas 560 em 2006. A partir desta data retomaram a actividade em mais alguns deles que tinham sido desactivados e iniciaram-se algumas novas explorações.
Surgiram, porém, novos actores na cena internacional:
A China e a Índia, que comportam cerca de um terço da população mundial e estão dependentes do petróleo para dar continuidade aos seus programas de desenvolvimento.
Estes novos consumidores gigantes sobrepuseram-se às economias industrializadas que foram relegadas para lugar secundário na ordem das prioridades a satisfazer.
Se surgiram novos grandes mercados consumidores dependentes, também surgiu a Rússia a disputar a liderança do mercado à Arábia Saudita, baseada nas suas imensas reservas recentemente activadas, localizadas no Árctico, na margem ocidental dos Urais, na Sibéria Oriental e na Ilha Sacalina.
No entanto, os indicadores Risco País, elaborados pelas agências especializadas, colocam os dois países em situação assaz diferente.
Enquanto a Arábia Saudita é classificada como país de “quite low risk”, a Federação Russa é classificada de “moderately high risk”.
Esta classificação não tem causado grandes dificuldades na captação de investimentos para o programa de desenvolvimento do sector petrolífero russo, tendo em consideração os recentes enormes investimentos realizados neste sector, pelos Estados Unidos, pelo Japão, pela China e até pela própria Arábia Saudita.
Admite-se, como dado adquirido, que ambos os governos são fortemente dependentes dos recursos gerados pelas suas exportações de hidrocarbonetos.
De acordo com as publicações do Fundo Monetário Internacional, enquanto para a Arábia Saudita contribuem com 38 por cento para a formação do seu Produto Interno Bruto, valem apenas 17 por cento para Federação Russa.
A Rússia, hoje considerada superpotência energética, já detém a liderança incontestada do mercado mundial do gás natural com uma quota de 22 por cento, e está em vias de conseguir idêntica posição no mercado do petróleo bruto, dado que pode vir a manter, a muito curto prazo, valores de produção próximas dos 10 milhões de barris diários, o que, na actualidade, corresponde a 12,5 por cento do total mundial produzido.
A actuação das forças do mercado dinamizaram uma transição no sector petrolífero russo que lhe permitiu não só desafiar a OPEP e a Arábia Saudita, como também captar a parte de leão da quota de crescimento da procura chinesa, indiana, japonesa e, eventualmente, até dos Estados Unidos.
Sublinhe-se que a situação actual do sector petrolífero dos Estados Unidos é preocupante, dado que passou de leader do mercado, nos bons velhos tempos, a rapidamente dependente da importação de nada menos do que dois terços das suas necessidades actuais, correspondentes a cerca de 25 por cento do total mundial produzido.

A conjunção das duas situações referidas, ou seja:

· o domínio exercido pela Federação Russa e pela Arábia Saudita, responsáveis por 26 por cento do petróleo entregue ao mercado
e
· a dependência dos Estados Unidos que, com apenas 4,5 por cento da população mundial, absorvem 23 por cento do petróleo entregue no mercado,

levam-nos a reflectir acerca dos riscos de uma actuação concertada eventualmente introduzida por russos e sauditas no sector produtivo e no mercado.

Estes desenvolvimentos conduzem a novos debates acerca do verdadeiro significado da segurança e que tipo de relações duráveis será agora possível estabelecer entre consumidores e produtores, de modo a que possam, a longo prazo, vir a satisfazer os interesses de ambos.
Para terminar, façamos uma rápida análise à evolução dos preços do petróleo bruto leve, dito convencional, ao longo dos últimos anos.
A análise da evolução da produção e abastecimento do petróleo bruto convencional ao mercado, pouco reflecte a variação dos preços.
Exceptuando os períodos que se seguiram aos dois choques petrolíferos, o consumo aumentou a taxas relativamente constantes, independentemente da variação dos preços correntes.
Constatamos, então, que os preços do barril dispararam em quatro ocasiões, devido não a causas imputáveis ao sector produtivo ou ao mercado, mas sim à ocorrência de factos políticos ou, até mesmo ao temor da sua ocorrência a curto prazo.

A primeira aconteceu com o embargo de fornecimentos da OPEP, imposta aos países que apoiaram a política dos Estados Unidos para o Médio Oriente, em 1973, o chamado 1º choque petrolífero.

A segunda deveu-se à ocorrência da revolução iraniana de 1979, que culminou com a deposição do Shah Reza Pahlavi e consequente bloqueio à extracção de petróleo dos seus poços em actividade normal. De seguida deflagrou a Guerra entre o Irão e o Iraque.
Foi o 2º choque petrolífero de consequências muito mais gravosas do que o primeiro.
Contou-se, porém, nessa conjuntura, com a preciosa ajuda da Noruega que passou de uma produção diária de cerca de 500.000 barris para os 3,5 milhões, o que a passou a colocar no importante lugar de terceiro maior exportador mundial de petróleo bruto convencional, posição que ainda ocupa, logo a seguir à Arábia Saudita e à Rússia.

A partir destes factos fortemente influenciadores dos preços, entrou-se num período de relativa estabilização, logo que foi atingido um novo mínimo em 1986.

A terceira ocasião chegou com a invasão do Kuwait pelas tropas iraquianas, em 1990, para voltar a estabilizar pouco depois.

Por último, a grande convulsão provocada pelo abrandamento económico mundial, consequente do ataque terrorista do 11 de Setembro nos Estados Unidos.
A partir desta última ocorrência, exógena ao sector produtivo petrolífero, os preços retomaram a sua tendência altista, a que não são alheios os baixos investimentos realizados durante as décadas de 1980 e 1990, nomeadamente à escala da prospecção e da abertura de novas extracções em bolsas petrolíferas comprovadas.
Enquanto a Arábia Saudita e a Federação Russa dominam e continuarão e dominar o mercado do petróleo convencional (o petróleo leve), a alternativa de continuidade de satisfação da procura constituída pelos petróleos pesados, extra-pesados e betumes, ainda muito modestamente aproveitados, é assumida, na sua quase totalidade, pela Venezuela e pelo Canadá.

Estas 4 superpotências energéticas – Arábia Saudita, Federação Russa, Venezuela e Canadá - poderão vir a constituir o núcleo dominante dos combustíveis hidrocarbonetos à escala mundial.

Não é demais relembrar que, de acordo com as estimativas avançadas pela International Energy Agency, o petróleo convencional disponível no mundo, corresponde, apenas, a 30 por cento do total, cabendo aos petróleos pesados e aos betumes, os restantes 70 por cento
Apesar dos imensos recursos disponíveis, estes só acrescentaram os seus 3 biliões de barris aos mais de 26 biliões de barris de petróleo bruto leve, actualmente produzidos.
O grande óbice à utilização maciça dos petróleos brutos não-convencionais (os pesados, extra-pesados e betumes), reside nos elevados custos de extracção e de processamento.

Recorde-se que o petróleo bruto leve (o petróleo convencional), a caminho de um rápido esgotamento, dispõe de uma característica fundamental inultrapassável:
jazente numa bolsa petrolífera sob pressão, jorra de um furo que atinge a bolsa que o contém, sem necessidade de grandes operações complementares para extracção e processamento ou de tecnologia específica.

Há que considerar que a extracção do petróleo não-convencional exige tecnologia e onerosos acrescidos recursos específicos: água e energia abundantes que garantam a injecção de vapor de água nas jazidas.
São, geralmente upgraded para lhes reduzir os componentes carboníferos ou para lhes adicionar hidrogénio, antes de as entregar às refinarias convencionais.
Os custos adicionais de processamento e upgrading explicam as razões pelas quais o desenvolvimento dos petróleos pesados e betumes ainda se encontra tão limitado.
O aumento das taxas de recuperação de depósitos do petróleo extra-pesado e dos betumes representa o desafio mais importante para que estas reservas se materializem.
No caso da Venezuela, membro da OPEP, já um grande exportador de petróleo bruto convencional, trata-se de petróleo pesado e extra-pesado com o inconveniente de comportar mais enxofre e contaminação de metais pesados que exigem uma muito mais complexa refinação.
Estas reservas venezuelanas, situadas na Faixa Petrolífera do Orinoco, estão estimadas em cerca de 2,2 triliões de barris, correspondendo a 90 por cento do total mundial estimado.
Neste particular, os pesados e extra-pesados venezuelanos beneficiam da localização na região do Rio Orinoco, onde foi construída, nos finais da década de 70, a mega-barragem e a Central Hidroeléctrica do Guri, com uma potência eléctrica instalada de 10.000 MW que disponibiliza abundante energia para a sua extracção e o processamento.
No caso do Canadá, recentemente assumido oil country, trata-se do aproveitamento de areias betuminosas a céu aberto, disponível em grandes quantidades no Athabasca, cujas reservas estão estimadas em cerca de 2,4 triliões de barris, correspondendo a 40 por cento do total mundial estimado.
A produção actual atinge cerca de 1 milhão de barris/dia, prevendo-se que venha a atingir os 3 milhões de barris diários no ano 2020, com previsões de chegar aos 5 milhões diários em 2030.
Para tanto, a Energy Alberta Corporation acaba de lançar a construção de uma central nuclear de reactores gémeos a entrar em serviço em 2016, para garantia do abastecimento da energia eléctrica necessária à extracção e processamento dos betuminosos do Athabasca, operados pela Shell Canada.
Recordo, para terminar esta análise, que os países da União Europeia, dependentes da importação de petróleo, pagaram por ele, o ano passado, cerca de 240.000 milhões de dólares. É evidente que qualquer subida substancial no valor do barril de petróleo provoca grande agitação nas suas economias.
Sublinhe-se que, dispondo apenas de 6,5 por cento da população mundial, contribui com mais de 25 por cento para o PIB total mundial e assegura 35,5 por cento das exportações de mercadorias e 34 por cento das importações registadas à escala mundial.
Contudo, é por demais conhecida a sua dependência no que se refere a combustíveis.
O consumo do conjunto dos países-membros da União Europeia ultrapassa largamente a produção, dado que consomem 6 vezes mais petróleo do que produzem, o dobro do gás natural e 1,8 vezes mais carvão.
Podem considerar-se excepções, a confortável situação da Dinamarca, excedentária tanto em petróleo bruto como em gás natural, suportada pelas reservas disponíveis no Árctico (via Gronelândia) e o equilíbrio mantido pelo Reino Unido.
A nova dimensão de segurança entre nações exportadoras e nações importadoras dependentes desta matéria-prima estratégica, resultará da interligação entre o investimento, a finança e o comércio.
Os produtores procurarão obter dos países consumidores: o capital, a tecnologia e a competência técnica, ao mesmo tempo que abastecerão os seus mercados.
Esta reorientação incitará a um redobrado esforço dirigido à investigação e à detecção de oportunidades, quer de investimento quer de participação no desenvolvimento das estruturas do sector.
Encontramo-nos hoje perante opções a tomar, que não podem continuar a ser adiadas, sob pena de nos vermos, a curto prazo, numa situação de carência generalizada, de consequências muito difíceis de ultrapassar:

· Se os preços do barril de petróleo forem colocados de tal modo baixos que os tornem acessíveis às economias débeis e dependentes da importação do petróleo para satisfazer as suas necessidades energéticas, desmotiva o investimento em novas descobertas e novas produções. Logo, o produto escasseará e provocará tomadas de posição que podem conduzir a conflitos de imprevisível dimensão.
· Se os preços forem colocados a um nível que incite o investimento, corre-se o risco do esmagamento global das economias dependentes, inclusivamente das ocidentais europeias e das norte-americanas.

Aos países extremamente dependentes que não o possam pagar, não restará outra saída que não seja a de optar por energias alternativas: hídrica (se tiverem água), eólica (se tiverem vento) ou biomassa (se tiverem solo arável e água). E fazer um esforço titânico para conseguir manter operacional o seu parque de transportes.
Daí a necessidade imperiosa da racionalização dos consumos do petróleo, da eficiência energética e do crescente recurso à utilização das energias alternativas, quer sejam de origem renovável, quer da controversa origem nuclear.

De uma consequência estamos certos: os custos associados ao cumprimento das exigências ambientais e aos investimentos a realizar nas novas eventuais descobertas de petróleo convencional, nas redes de oleodutos seguros e no desenvolvimento da tecnologia e processamento dos petróleos não-convencionais serão, inevitavelmente endossados aos consumidores.